O que é hiperaldosteronismo primário: sinais, triagem e manejo

O que é hiperaldosteronismo primário: sinais, triagem e manejo

Voltado para profissionais de saúde e pacientes bem informados. O hiperaldosteronismo primário (HAP) é uma causa tratável de hipertensão com impacto relevante no risco cardiovascular. Este texto resume fisiopatologia, sinais clínicos, estratégia de triagem com ARR, confirmação diagnóstica, investigação etiológica e opções de tratamento, incluindo adrenalectomia e terapia farmacológica com antagonistas de receptor de mineralocorticoide.

hiperaldosteronismo primário: definição e fisiopatologia

O hiperaldosteronismo primário resulta da produção autónoma de aldosterona pelas glândulas adrenais, independentemente da atividade do sistema renina‑angiotensina. As causas mais comuns são adenoma produtor de aldosterona (unilateral) e hiperplasia adrenal bilateral. O excesso de aldosterona aumenta a reabsorção de sódio e água e promove perda de potássio no túbulo coletor, levando a hipertensão e, por vezes, hipocalemia. Essa disfunção eleva o risco de eventos cardiovasculares ao longo do tempo.

sinais clínicos: quando suspeitar

A apresentação é variável. Nem todos os pacientes têm hipocalemia; por isso, a ausência de potássio baixo não exclui HAP. Situações que aumentam a suspeita incluem:

  • Hipertensão resistente (pressão persistentemente acima da meta apesar de três anti‑hipertensivos, incluindo um diurético, ou necessidade de quatro drogas para controle).
  • Hipocalemia espontânea ou associada a uso de diurético; sintomas como fraqueza muscular, cãibras e parestesias.
  • Início precoce da hipertensão (<40–50 anos) ou história familiar de hipertensão grave.
  • Lesões adrenais incidentais associadas a hipertensão.

triagem: ARR (aldosterona/renina) e fatores a considerar

A triagem inicial usa a relação aldosterona plasmática/atividade da renina plasmática (ARR). Um ARR elevado sugere HAP, mas a interpretação exige atenção a fatores que alteram os valores:

  • Medicações que interferem: diuréticos, antagonistas do receptor de mineralocorticoide (espironolactona, eplerenona), IECA, BRA, betabloqueadores, AINEs; se possível, ajustá‑las conforme protocolo local antes da dosagem.
  • Estado de volume e dieta de sódio: hipervolemia ou depleção volêmica podem distorcer resultados.
  • Função renal alterada pode alterar os níveis de renina e aldosterona.

Valores persistentemente elevados do ARR justificam testes de confirmação.

aldosterona e renina: interpretação prática

Para o cálculo do ARR, informa‑se a aldosterona plasmática (Ald) e a atividade da renina plasmática (ARP). Alta Ald com renina suprimida sugere produção autônoma de aldosterona. Sempre consulte os intervalos de referência do laboratório e ajuste a investigação conforme o contexto clínico.

testes de confirmação

Os testes confirmatórios demonstram a incapacidade de suprimir a produção de aldosterona. Opções comuns:

  • Teste de carga oral de sódio com mensuração de aldosterona.
  • Teste de infusão salina (saline infusion test).
  • Supressão com fludrocortisona (fludrocortisone suppression test) quando disponível e seguro.

A escolha depende da disponibilidade local e do perfil do paciente. Resultados positivos orientam a investigação etiológica.

avaliação etiológica: imagem e AVS

Após confirmação bioquímica, procede‑se à diferenciação entre doença unilateral e bilateral. A tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM) de adrenais identifica nódulos ou hiperplasia, mas imagens sozinhas podem ser insuficientes.

AVS (amostragem venosa adrenal)

O AVS é o padrão‑ouro para definir lateralidade quando a cirurgia é considerada. É procedimento técnico e deve ser realizado em centro experiente, pois orienta a indicação de adrenalectomia. Em pacientes jovens com adenoma claro na imagem e concordância clínica, alguns centros optam por cirurgia sem AVS, mas a decisão deve ser individualizada.

manejo: adrenalectomia e tratamento medicamentoso

A estratégia terapêutica depende da etiologia e das características do paciente.

adrenalectomia (etiologia unilateral)

Na presença de adenoma unilateral comprovado, a adrenalectomia laparoscópica pode curar ou melhorar substancialmente a hipertensão e corrigir a hipocalemia. A decisão envolve avaliação multidisciplinar (endocrinologia, cirurgia, anestesiologia) e discussão dos riscos e benefícios com o paciente. Pós‑operatório pode demandar ajuste de medicações antihipertensivas e monitoramento laboratorial.

antagonistas do receptor de mineralocorticoide (etiologia bilateral)

Quando a doença é bilateral ou a cirurgia não é indicada, o tratamento de escolha são os antagonistas do receptor de mineralocorticoide:

  • Espironolactona: eficaz para controlar hipertensão e normalizar potássio, porém associada a efeitos androgênicos (ginecomastia, disfunção sexual) em alguns pacientes.
  • Eplerenona: alternativa com menor atividade antiandrogênica, mas custo e disponibilidade podem limitar o uso.

O objetivo é alcançar normocalemia e metas pressóricas realistas. Monitorar potássio e função renal após início ou titulação.

seguimento e impacto cardiovascular

O tratamento adequado reduz risco de eventos cardiovasculares e melhora controle pressórico. O seguimento inclui:

  • Monitorização regular da pressão arterial e ajuste de anti‑hipertensivos.
  • Verificação periódica do potássio sérico e da função renal, especialmente nas primeiras semanas após mudanças terapêuticas.
  • Avaliação de risco cardiovascular global e manejo de fatores associados (perfil lipídico, glicemia, estilo de vida).

próximos passos práticos

Na prática clínica: suspeite de HAP em hipertensão resistente ou hipocalemia inexplicada; realize triagem com ARR considerando interferências medicamentosas; confirme com teste de supressão adequado; investigue lateralidade com imagem e, quando indicado, AVS; escolha adrenalectomia para doença unilateral e antagonistas de mineralocorticoide para doença bilateral. Coordenação com endocrinologia e cirurgia otimiza os resultados.

Para integrar essa abordagem às diretrizes de manejo da hipertensão e objetivos de tratamento no consultório, consulte as diretrizes práticas da hipertensão e orientações sobre metas realistas de manejo da hipertensão. Em pacientes idosos, as recomendações específicas estão em manejo da hipertensão em idosos. Para interpretação laboratorial rotineira, veja também interpretação de exames de rotina.

Notas práticas: a triagem com ARR é um ponto de partida essencial, mas demanda interpretação contextual; a confirmação bioquímica e a avaliação etiológica são fundamentais para decidir entre adrenalectomia e tratamento clínico com espironolactona ou eplerenona. O acompanhamento longitudinal é indispensável para reduzir riscos cardiovasculares e otimizar qualidade de vida.

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