Cefaleias em adultos: guia prático para clínicos

Cefaleias em adultos: guia prático para clínicos

Você atende pacientes com dor de cabeça frequente e precisa decidir entre tranquilizar, tratar ou encaminhar? As cefaleias são comuns, heterogêneas e exigem raciocínio clínico estruturado para distinguir cefaleias primárias (como enxaqueca, cefaleia tensional e cefaleia em salvas) de causas secundárias potencialmente graves. Este guia prático resume sinais de alerta, abordagem diagnóstica e manejo inicial aplicáveis na atenção primária e no pronto-socorro.

1. Abordagem inicial: anamnese e exame

1.1 História dirigida

Faça perguntas objetivas sobre:

  • Início (súbito vs gradual), frequência, duração e padrão temporal.
  • Características da dor: localização, qualidade (pulsátil, em aperto), intensidade e intensidade máxima.
  • Sintomas associados: náusea, vômito, fotofobia, fonofobia, sintomas autonômicos, alterações visuais, alterações cognitivas.
  • Fatores precipitantes e de alívio, uso de medicamentos analgésicos (risco de medication overuse headache), história familiar e comorbidades (câncer, imunossupressão, doenças vasculares).

1.2 Exame físico focado

Realize exame neurológico detalhado (pares cranianos, força, sensibilidade, reflexos, coordenação), verifique sinais vitais, pesquise rigidez de nuca e fundoscopia para papiledema. Alterações focais justificam investigação imediata.

2. Identificação de sinais de alerta (“red flags”)

Presença de qualquer uma destas situações exige investigação complementar urgente (imagem neuroaxial, punção lombar quando indicada) ou encaminhamento:

  • Início súbito e intenso (“pior dor da vida” / cefaleia em trovão).
  • Febre alta e rigidez de nuca — suspeita de meningite/encefalite.
  • Déficits neurológicos focais, convulsões ou alteração de nível de consciência.
  • Papiledema ou sinais de hipertensão intracraniana.
  • Idade superior a 50 anos com nova cefaleia, início progressivo e padrão diferente do habitual.
  • História de câncer, imunossupressão ou trauma craniano recente.
  • Uso crônico/abuso de analgésicos com piora paradoxal (suspeitar de cefaleia por abuso de medicação).

Para detalhes de investigação por imagem e condutas diagnósticas, consulte recomendações práticas sobre diagnóstico por imagem em atendimento ambulatorial: diagnóstico e imagem no consultório.

3. Manejo inicial (abortivo e preventivo)

3.1 Princípios gerais

No atendimento inicial escolha tratamentos com evidência, ajuste ao perfil do paciente e controle efeitos adversos. Oriente limites de uso de analgésicos àqueles com risco de medication overuse. Para suporte à prescrição segura, utilize recursos sobre prescrição segura de analgésicos.

3.2 Enxaqueca

  • Ações abortivas: triptanos (sumatriptano, zolmitriptano) em pacientes sem contraindicação cardiovascular; AINEs ou analgesia combinada (por ex. naproxeno ou diclofenaco) quando triptanos não disponíveis ou contraindicados.
  • Tratamento inicial em crise leve-moderada: AINEs + antiemético (metoclopramida ou proclorperazina) se náusea importante.
  • Profilaxia: considerar betabloqueadores, bloqueadores dos canais, antidepressivos ou anticonvulsivantes quando crises são frequentes/invalidantes; avaliar riscos, comorbidades e preferência do paciente.

3.3 Cefaleia tensional

  • Analgésicos simples (paracetamol, AINEs) para crises intermitentes.
  • Abordagens não farmacológicas: técnicas de relaxamento, terapia cognitivo-comportamental e fisioterapia para dor musculoesquelética cervical — ver manejo da dor crônica e reabilitação.
  • Profilaxia com amitriptilina em casos crônicos selecionados.

3.4 Cefaleia em salvas (cluster)

  • Tratamento agudo: oxigenoterapia de alto fluxo (100% O2 a 12 L/min por 15 minutos) quando disponível e sumatriptano subcutâneo.
  • Profilaxia e terapia aguda adicional: ver opções com verapamil e, em centros especializados, terapias invasivas ou neuromodulação em casos refratários.

4. Quando investigar com imagem ou punção lombar

Solicite TC ou RNM conforme sinal clínico: TC sem contraste é a escolha inicial diante de cefaleia súbita (excluir hemorragia subaracnóidea); RNM com protocolos vasculares (angio-RNM) quando suspeita de doença vascular ou lesões estruturais. Se suspeita de meningite e neuroimagem for negativa ou adiada, realize punção lombar para análise do líquido cefalorraquidiano.

Casos com alterações neurológicas progressivas, papiledema ou imunossupressão exigem investigação urgente e encaminhamento ao serviço de neurologia ou emergência.

5. Critérios e caminhos de encaminhamento

  • Encaminhar com prioridade para neurologista: presença de red flags, falha terapêutica após tratamento inicial adequado, cefaleia crônica incapacitante ou necessidade de terapias profiláticas avançadas.
  • Encaminhar para avaliação multidisciplinar (fisioterapia, psicologia/psiquiatria, unidade de dor): quando houver componente musculoesquelético, comorbidades psiquiátricas (ansiedade/depressão) ou dor refratária. Consulte também abordagem integrada de saúde mental na atenção primária: saúde mental: triagem e manejo inicial.
  • Considerar encaminhamento especializado para investigação secundária (neurocirurgia, infectologia, reumatologia) conforme achados.

6. Cuidados práticos e segurança

Registre detalhadamente o padrão da cefaleia, medicamentos usados e resposta terapêutica. Eduque o paciente sobre limites do uso de analgésicos, sinais de alarme e quando retornar. Ao prescrever profiláticos, monitore efeitos adversos e interações — recomenda-se consulta de rotina sobre prescrição responsável em analgesia e antimicrobianos.

Fechamento e recomendações práticas

No atendimento, priorize uma anamnese estruturada e exame direcionado; identifique rapidamente as red flags e trate crises conforme o fenótipo (enxaqueca, cefaleia tensional, cefaleia em salvas). Use estratégias não farmacológicas e condutas de desprescrição quando houver uso excessivo de analgésicos. Encaminhe precocemente nos casos suspeitos de causa secundária, falha terapêutica ou necessidade de terapias avançadas. Para atualização prática sobre diagnóstico e manejo ambulatorial, consulte revisões e diretrizes disponíveis, como as publicações da SECAD e revisões clínicas detalhadas (por exemplo, SECAD — atualização no manejo ambulatorial e a revisão sobre diagnóstico diferencial publicada na Acta Médica: Acta Médica (2012)). Para aprofundamento em patogenia e opções terapêuticas da enxaqueca veja também a revisão clínica disponível na Intramed: Enxaqueca: patogênese e tratamento (Intramed).

Este conteúdo destina-se a profissionais de saúde na prática ambulatorial e de urgência; adapte as recomendações ao contexto local, disponibilidade de recursos e risco individual do paciente.

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