Infertilidade masculina: triagem e manejo inicial
Mais de 1–2% da população masculina em idade reprodutiva procura avaliação por infertilidade. A identificação precoce de causas tratáveis encurta o caminho para a concepção e reduz o impacto emocional no casal. Este texto, dirigido a profissionais de saúde, oferece orientação prática e atualizada para triagem, diagnóstico e manejo inicial, com ênfase em evidências, fluxos de encaminhamento e medidas aplicáveis na atenção primária e secundária.
Infertilidade masculina: por que a triagem é crucial?
A infertilidade masculina resulta de causas testiculares, obstrutivas, endócrinas ou genéticas. Intervenções simples — mudanças de estilo de vida, tratamento de infecções, correção de varicocele ou terapia hormonal adequada — podem melhorar parâmetros do sêmen e as chances de gravidez. Uma abordagem estruturada permite também identificar situações que exigem reprodução assistida, como azoospermia, ou encaminhamento precoce para centros especializados.
Avaliação inicial e objetivos
Objetivos claros: confirmar ou excluir comprometimento seminal, identificar causas tratáveis (p.ex., varicocele, infecção, hipogonadismo) e definir plano de manejo incluindo opções de reprodução assistida quando indicado.
Anamnese e exame físico (espermatograma como base)
Anamnese detalhada
- Tempo de tentativa de concepção; histórico reprodutivo do casal.
- História de doenças congênitas, infecções genitais, cirurgias ou traumas testiculares.
- Uso de medicamentos e terapias hormonais, exposição a tóxicos ocupacionais, tabagismo, álcool e drogas recreativas.
- Disfunção erétil, ejaculação retrógrada ou sinais sugestivos de obstrução dos ductos.
Exame físico direcionado
- Avaliação do volume e consistência testicular, presença de varicocele, assimetria ou massas.
- Sinais de hipogonadismo (distribuição de pelos, massa muscular, ginecomastia) e avaliação da genitália externa.
Espermatograma: coleta, interpretação e repetição
O espermatograma é o pilar diagnóstico. Recomenda-se abstinência sexual de 2–5 dias antes da coleta e amostra de laboratório com controle de qualidade. Parâmetros-chave: concentração, motilidade e morfologia. Alterações devem ser confirmadas em nova amostra, preferencialmente 2 a 3 semanas após a primeira, considerando variabilidade intraindividual e métodos de análise (critérios OMS).
Exames laboratoriais e hormonais
- Testosterona total (em horário recomendado), LH, FSH e prolactina como triagem inicial. SHBG e estradiol dependendo do contexto clínico.
- AMH pode ser útil em cenários selecionados para avaliar reserva testicular, embora sua utilização clínica ainda varie conforme laboratório.
- Quando houver azoospermia, dosagem de FSH e exame imaginológico ajudam a distinguir azoospermia obstrutiva de não obstrutiva.
Exames de imagem indicados
- Ultrassonografia escrotal em suspeita de varicocele, massa testicular ou assimetria.
- Exames adicionais (p.ex., avaliação endócrina sistêmica) conforme sintomas e resultados laboratoriais.
Causas tratáveis: triagem e sinais direcionadores
Varicocele
Varicocele pode reduzir a qualidade do sêmen. Em casos com impacto seminal comprovado ou dor/disconforto, a varicocelectomia pode melhorar parâmetros e, ocasionalmente, taxas de gravidez. Decisão terapêutica leva em conta grau, parâmetros do espermograma e preferência do casal.
Distúrbios hormonais (hipogonadismo)
Hipogonadismo primário ou secundário diminui a espermatogênese. Em homens que desejam paternidade, terapias com testosterona exógena são contraindicadas por suprimir espermatogênese; alternativas incluem clomifeno, letrozol ou gonadotrofinas para estimular produção testicular quando apropriado. Planeje supervisão laboratorial (hormônios, hematócrito, densidade óssea) e escolha terapêutica com base no eixo hormonal e na reserva testicular.
Infecções e inflamação
Infecções do trato genital podem afetar motilidade e concentração espermática. Tratamento adequado de agentes bacterianos e manejo de inflamação crônica podem reverter ou melhorar parâmetros. Em casos selecionados, avaliar anticorpos anti-espermatozoides e marcadores inflamatórios locais.
Obstruções e causas anatômicas
Obstruções dos ductos deferentes levam à azoospermia obstrutiva. Em situações obstrutivas irreversíveis, técnicas de recuperação de espermatozoides (TESE, micro-TESE) combinadas a IVF/ICSI são opções viáveis.
Manejo inicial no consultório
Mudanças no estilo de vida
- Controle de peso e dieta anti-inflamatória; otimização do perfil metabólico.
- Abstinência de tabaco, redução de álcool e cessação de drogas recreativas.
- Exercício físico regular, evitando exercício excessivo que possa reduzir temporariamente a contagem de espermatozoides.
- Evitar exposições a calor testicular excessivo (banhos muito quentes, saunas frequentes).
Intervenções médicas e farmacológicas
- Antibióticos direcionados para infecções comprovadas.
- Discussão com especialista sobre terapias hormonais estimulantes (clomifeno, letrozol, gonadotrofinas) quando indicadas.
- Encaminhamento para intervenção cirúrgica quando indicado (varicocelectomia, correção de obstrução).
Reprodução assistida: indicações práticas
Quando intervenções conservadoras não normalizam o espermograma ou há azoospermia, considerar técnicas de reprodução assistida. Opções:
- IUI (inseminação intrauterina): indicado em oligozoospermia leve a moderada com motilidade preservada e parceira com boa reserva ovariana.
- IVF com ICSI: preferência em casos de baixa motilidade, morfologia severamente alterada ou azoospermia com recuperação de espermatozoides.
- TESE/micro-TESE para recuperação de espermatozoides em azoospermia obstrutiva ou selecionada na não obstrutiva.
Encaminhamento e fluxos clínicos
Encaminhe para centros de fertilidade quando houver: azoospermia, espermatograma persistentemente anormal sem causa identificada, alterações hormonais com impacto reprodutivo claro ou falha de manejo conservador. Encaminhamento também é indicado para procedimentos de recuperação de espermatozoides ou quando for necessária avaliação genética.
Ações práticas no consultório: espermatograma, documentação e acompanhamento
1) Confirme alterações com repetição do espermatograma e documente metodologia laboratorial; 2) Monitore tratamentos hormonais e o efeito de intervenções cirúrgicas; 3) Oriente o casal sobre probabilidades realistas e tempo esperado para concepção; 4) Ofereça encaminhamento precoce para reprodução assistida quando indicado e suporte psicológico quando necessário; 5) Registre consentimento informado, riscos e alternativas para permitir decisões compartilhadas.
Fontes e diretrizes para prática baseada em evidência
Fundamente o manejo em diretrizes atualizadas e revisões sistemáticas. Para referência prática no contexto do blog, consulte conteúdos associados como fundamentos da prática clínica segura e protocolos clínicos e diretrizes práticas, que ajudam a estruturar raciocínio diagnóstico e fluxos de encaminhamento.
Palavras-chave abordadas: infertilidade masculina, espermatograma, varicocele, azoospermia, reprodução assistida e hipogonadismo.