O que é angina microvascular: sinais, diagnóstico e manejo atual

O que é angina microvascular: sinais, diagnóstico e manejo atual

Angina microvascular, também conhecida como INOCA (Ischemia with Non-Obstructive Coronary Arteries), refere-se à presença de dor torácica associada a isquemia comprovada ou suspeita, com angiografia não obstrutiva. Ao contrário da angina por aterosclerose obstrutiva, a causa está na disfunção microvascular e/ou na disfunção endotelial das pequenas artérias coronárias, que comprometem a perfusão miocárdica em situações de aumento da demanda. O reconhecimento dessa condição é essencial na prática clínica, especialmente na atenção primária e na cardiologia, pois é frequente — sobretudo em mulheres — e exige abordagem diagnóstica e terapêutica específica.

Definição, epidemiologia e impacto clínico

A INOCA é comum entre pacientes com dor torácica e angiografia sem obstrução significativa: estudos mostram que até 40% das pessoas com dor torácica estável apresentam coronariopatia não obstrutiva, e uma parcela importante desses casos corresponde a disfunção microvascular. Mulheres têm maior prevalência relativa de disfunção microvascular e sintomas isquêmicos sem lesões coronárias obstrutivas. A condição compromete qualidade de vida, limita atividades e pode gerar ansiedade e uso recorrente de serviços de saúde.

Reconhecer a INOCA evita subdiagnóstico e tratamentos inadequados. Termos-chave relacionados que o clínico deve dominar incluem disfunção microvascular, disfunção endotelial e reserva de fluxo coronário (CFR), que aparecem ao longo da avaliação e do manejo.

Fisiopatologia da disfunção microvascular

  • Disfunção endotelial: o endotélio regula vasodilatação, inflamação e interação plaquetária; sua disfunção reduz a vasodilatação adequada em situações de estresse.
  • Disfunção microvascular coronária: redução da reserva de fluxo coronário (CFR) e aumento da resistência microvascular (medida por IMR) limitam o aumento do fluxo durante esforço.
  • Inflamação e estresse oxidativo: processos inflamatórios crônicos prejudicam a função microvascular e o endotélio.
  • Alterações neurovasculares: sensibilidade neural e processamento central da dor podem amplificar sintomas mesmo sem grande alteração anatômica coronária.

Na prática, a INOCA resulta da combinação de disfunção endotelial e microvasculopatia, levando a isquemia sob maior demanda, apesar da ausência de obstrução nas grandes artérias coronárias.

Sinais, sintomas e apresentação clínica

A apresentação varia: alguns pacientes têm dor torácica típica de angina; outros relatam sintomas atípicos. Sinais e pistas que sugerem INOCA incluem:

  • Dor torácica desencadeada por esforço ou estresse emocional, frequentemente aliviada por repouso ou nitroglicerina.
  • Dispneia, fadiga e sensação de aperto torácico; sintomas podem ser mais sutis em mulheres.
  • Isquemia documentada em testes não invasivos ou invasivos, com angiografia coronária sem estenose ≥ 50%.
  • Resposta clínica desproporcional aos achados anatômicos coronários.

É importante não minimizar a queixa de dor torácica em mulheres ou em pacientes com fatores de risco como hipertensão, diabetes e dislipidemia. A investigação direcionada é necessária para diagnóstico e tratamento apropriados.

Diagnóstico: estratégia prática na prática clínica

O diagnóstico de INOCA exige confirmar isquemia, excluir obstrução coronária significativa e, quando possível, avaliar a função microvascular/endotelial. A investigação em etapas costuma ser a mais eficiente.

1) Descarte de doença arterial obstrutiva

Inicialmente confirme a ausência de obstrução relevante por angiografia coronária. Quando a angiografia é não obstrutiva e a suspeita clínica persiste, avance para avaliação funcional.

2) Avaliação não invasiva da função microvascular

Testes não invasivos úteis incluem:

  • Ecocardiografia de estresse com avaliação segmentar e perfusão quando disponível.
  • Ressonância magnética cardíaca (CMR) com perfusão para quantificação de isquemia e fluxo sem radiação.
  • Tomografia com perfusão em cenários selecionados.

Esses exames podem demonstrar isquemia induzida pela microvasculatura mesmo na ausência de lesão obstrutiva.

3) Avaliação invasiva da função microvascular/endotelial

Em centros especializados, realize testes invasivos de função coronária com cateteres que medem pressão e fluxo para obter:

  • Reserva de fluxo coronário (CFR).
  • Índice de resistência microvascular (IMR).
  • Teste de vasomotilidade com acetilcolina para identificar vasoespasmo coronariano.

Alterações nesses parâmetros confirmam disfunção microvascular e orientam o tratamento mais específico.

Tratamento: estratégias farmacológicas e de estilo de vida

O manejo da INOCA combina modificação de fatores de risco, terapias antianginosas e tratamento das comorbidades, com foco em melhorar a reserva de fluxo e a qualidade de vida.

1) Modificação de fatores de risco e estilo de vida

  • Controle glicêmico adequado em diabetes.
  • Perda de peso e dieta baseada em padrões mediterrâneo ou DASH, reduzindo inflamação sistêmica.
  • Atividade física regular (≈150 minutos/semana de intensidade moderada) para melhorar função endotelial e tolerância ao esforço.
  • Parar de fumar e reduzir consumo excessivo de álcool.
  • Monitorização e controle de hipertensão e dislipidemia.

Para suporte prático ao manejo de fatores de risco, considere materiais sobre manejo da hipertensão, metas e terapias em dislipidemia e programas de reabilitação cardiovascular, que podem ser ferramentas úteis na atenção primária e especializada.

2) Abordagem farmacológica antianginosa

As opções devem ser individualizadas. Entre as medicamentos frequentemente utilizados estão:

  • Bloqueadores de cálcio (úteis quando a vasodilatação microvascular é relevante).
  • Nitratos (alívio sintomático em alguns pacientes; cuidado com hipotensão e tolerância).
  • Beta-bloqueadores (quando há predomínio de aumento da demanda cardíaca).
  • IECA/ARB para benefício endotelial e controle de comorbidades.
  • Estatinas para dislipidemia e efeitos pleiotrópicos sobre o endotélio.
  • Ranolazina em casos refratários, quando disponível.
  • Tratamento de ansiedade e suporte psicossocial, que influenciam percepção da dor e adesão terapêutica.

A combinação terapêutica deve considerar tolerância, comorbidades e resposta clínica. O objetivo é reduzir episódios isquêmicos, melhorar CFR/IMR quando possível e elevar a qualidade de vida.

3) Tratamento de comorbidades e prevenção secundária

  • Controle rigoroso de diabetes e hipertensão.
  • Tratamento intensivo de dislipidemia com estatinas e intervenções no estilo de vida.
  • Revisão de medicamentos que possam afetar a função vascular e atenção à polifarmácia.

Em populações específicas, como mulheres e pacientes com doenças autoimunes, o acompanhamento multidisciplinar e a individualização das terapias são fundamentais. Para conteúdo focado em gênero, veja o material sobre doenças cardiovasculares em mulheres.

Prognóstico e acompanhamento

O prognóstico depende do controle dos fatores de risco, adesão terapêutica e otimização do tratamento antianginoso. Em alguns casos, o risco de eventos cardiovasculares pode ser comparável ao da angina obstrutiva se os fatores de risco não forem tratados. O acompanhamento deve incluir avaliação periódica de sintomas, qualidade de vida e ajuste de terapias.

Ações práticas recomendadas para o dia a dia clínico

  • Adote uma abordagem estruturada para dor torácica: avaliar risco, excluir obstrução coronária e considerar investigação funcional da microvasculatura quando indicado.
  • Inicie modulação de fatores de risco (hipertensão, diabetes, dislipidemia) com metas individualizadas.
  • Use terapias antianginosas conforme tolerância e resposta, ajustando combinações quando necessário.
  • Encaminhe para avaliação especializada se os sintomas persistirem apesar da otimização clínica.
  • Enfatize adesão ao tratamento e participe de programas de reabilitação cardíaca quando indicados, que melhoram capacidade funcional e desfechos.

Integre materiais de apoio e protocolos locais, por exemplo estratégias de prevenção cardiovascular na atenção primária, para reforçar educação do paciente e práticas baseadas em evidência.

Referências e diretrizes práticas

Diretrizes recentes reforçam a avaliação de sintomas, fatores de risco e função microvascular, com recomendações escalonadas para investigação invasiva ou não invasiva conforme disponibilidade e apresentação clínica. A literatura sobre fisiologia coronária (CFR, IMR), disfunção endotelial e intervenções farmacológicas continua em evolução; mantenha-se atualizado com protocolos locais e diretrizes das sociedades de cardiologia.

Em resumo, a angina microvascular (INOCA) é um diagnóstico frequente e relevante que exige reconhecimento, investigação funcional direcionada e abordagem multidisciplinar para reduzir sintomas e risco cardiovascular. O manejo eficaz combina controle de fatores de risco, terapias antianginosas adaptadas e suporte à adesão, incluindo reabilitação cardiovascular e atenção às comorbidades.

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