Saúde bucal integrada na atenção primária
Introdução
Como a atenção primária pode reduzir risco cardiovascular, melhorar controle glicêmico e prevenir complicações respiratórias a partir da boca? A saúde bucal integrada não é apenas acesso a procedimentos: é ação preventiva, triagem direcionada e encaminhamentos claros que impactam doenças sistêmicas. Desde a implementação da Política Nacional “Brasil Sorridente” (2004) e com recentes marcos legais, há respaldo para ampliar práticas integradas na atenção primária à saúde.
Por que integrar saúde bucal e atenção primária?
A integração permite identificação precoce de sinais orais com relevância sistêmica e intervenções que modificam desfechos. Há evidências que associam periodontite a maior risco de eventos cardiovasculares e pior controle glicêmico em pessoas com diabetes, além de conexões com quadros respiratórios. Profissionais da atenção primária devem entender esses vínculos para priorizar prevenção e encaminhamentos oportunos (ver análise e políticas do Ministério da Saúde sobre Brasil Sorridente).
Pontos clínicos centrais
- Relação inflamatória: inflamação periodontal pode aumentar carga inflamatória sistêmica e afetar controle metabólico.
- Risco para populações vulneráveis: gestantes, idosos e pessoas com comorbidades apresentam maior necessidade de coordenação de cuidados.
- Impacto na qualidade de vida: dor orofacial, perda dentária e dificuldades mastigatórias influenciam nutrição e adesão a tratamentos crônicos.
Como operacionalizar ações preventivas e de triagem na unidade básica
Apresentei a seguir um fluxo prático aplicável na rotina da atenção primária à saúde, com elementos de prevenção, avaliação e critérios de encaminhamento.
1. Rotina de triagem e registro
- Incluir exame bucal básico em consultas regulares: exame de mucosa, gengivas, mobilidade dentária e presença de lesões ulceradas.
- Documentar achados no prontuário e marcar risco (baixo, moderado, alto) conforme sinais — sangramento à sondagem, bolsa periodontal, mobilidade, lesões suspeitas.
- Utilizar protocolos locais para integração de dados e encaminhamento; a coordenação com a equipe odontológica facilita continuidade do cuidado.
2. Intervenções preventivas na atenção primária
- Educação em saúde bucal: orientação sobre escovação, uso de fio dental, cessação tabágica e dieta — incorporar em educação terapêutica para doenças crônicas.
- Aplicações tópicas quando disponíveis (fluoretação) e encaminhamento para selantes em jovens de alto risco.
- Vacinação e medidas respiratórias: reforçar medidas que reduzam risco de infecções respiratórias graves quando aplicável.
3. Critérios práticos de encaminhamento
Encaminhe ao cirurgião-dentista ou serviço regional quando identificar:
- Úlcera oral que persista > 2 semanas sem causa aparente — suspeita de lesão potencialmente maligna.
- Mobilidade dentária acentuada, abscesso, dor aguda que não responde a medidas iniciais.
- Pacientes com diabetes descompensado e sinais clínicos de periodontite avançada; discutir prioridade de atendimento com equipe odontológica.
- Gestantes com quadros infecciosos orais ou dor — seguir diretrizes específicas para atendimento de gestantes.
Governança, diretrizes e políticas públicas
As ações na atenção primária devem estar alinhadas às diretrizes clínicas e políticas vigentes. A Política Nacional de Saúde Bucal (Brasil Sorridente) reorganizou o acesso odontológico no SUS e orienta ações de promoção e prevenção; para detalhes institucionais consulte o portal do Ministério da Saúde sobre a política. A Lei nº 14.572/2023 reforça a integração da saúde bucal na atenção primária e incentiva modelos inovadores de cuidado para reduzir desigualdades.
Há também diretrizes específicas em elaboração e consulta pública para manejo de lesões de cárie radicular e outras condutas odontológicas na APS — é importante participar e implementar o que estiver aprovado pelas coordenações locais.
Implementação prática: educação, teleodontologia e uso racional de antimicrobianos
Para transformar política em prática clínica, foque em três frentes:
Capacitação da equipe
- Treinamentos breves para equipes de saúde (médicos, enfermeiros, agentes comunitários) sobre exame bucal básico e sinais de alarme.
- Integração interprofissional com reuniões periódicas entre odontologia e equipe multiprofissional.
Teleodontologia e fluxos de referência
Teleodontologia pode ampliar acesso e acelerar triagem e seguimento em áreas remotas — combine consultas remotas para orientação inicial com agendamento presencial quando necessário.
Prescrição racional
Adote políticas de prescrição racional de antibióticos em infecções orais, alinhadas ao stewardship local, evitando uso inadequado que contribua para resistência. Coordenar condutas com a equipe de odontologia e utilizar protocolos escritos reduz variação e risco de iatrogenia.
Encaminhamentos e fluxos intersetoriais
Defina caminhos claros na sua rede de atenção: quando encaminhar para odontologia de atenção básica, quando elevar para atenção especializada (cirurgia oral, estomatologia, bucomaxilofacial) e quais exames ou anexos enviar com o paciente. Para facilitar adesão e continuidade, disponibilize material educativo e agende retorno conjunto quando possível.
Fechamento e próximos passos práticos
Para a atenção primária, adotar saúde bucal integrada significa implantar triagem sistemática, protocolos de prevenção e critérios de encaminhamento bem definidos. Comece por:
- Incluir exame bucal nas consultas de rotina e registrar risco periodontal.
- Padronizar critérios de encaminhamento (úlceras >2 semanas, dor/abscesso, periodontite severa, gestantes com sinais infecciosos).
- Capacitar a equipe e usar teleodontologia para agilizar triagens em áreas remotas.
Recursos úteis para implementação local incluem os materiais do Ministério da Saúde sobre a Política Nacional de Saúde Bucal e as diretrizes em consulta pública para manejo de lesões de cárie radicular. Para referência sobre impacto da periodontite em doenças sistêmicas consulte análises técnicas estaduais e, para aspectos legais e de organização da atenção, a atualização trazida pela Lei nº 14.572/2023.
Leituras e recursos práticos
- Política Nacional de Saúde Bucal (Brasil Sorridente) — informações institucionais e orientações de organização do cuidado: gov.br — Brasil Sorridente.
- Revisão sobre ligações entre periodontite e doenças sistêmicas e orientações técnicas estaduais: saude.mg.gov.br — saúde bucal e doenças sistêmicas.
- Atualizações legislativas e incentivos à integração na atenção primária: atencaoprimaria.es.gov.br — Lei nº 14.572/2023 e integração.
Recursos internos do blog (para equipe)
- Integração saúde bucal atenção primária — protocolo prático para atuação na UBS.
- Prescrição racional de antibióticos — orientações aplicáveis a infecções orais.
- Educação e adesão terapêutica — ferramentas para melhorar hábitos de higiene oral em pacientes crônicos.
- Teleodontologia — modelos de triagem e seguimento remoto.
Implementar ações integradas na atenção primária é um investimento em prevenção e em redução de carga de doenças sistêmicas. Comece com pequenas mudanças de fluxo, treine sua equipe e fortaleça os canais de encaminhamento: os resultados clínicos e populacionais acompanham a boa coordenação.