Determinantes sociais da saúde (DSS) influenciam fortemente morbi‑mortalidade, adesão ao tratamento, utilização de serviços e resultados clínicos. Na atenção primária, a triagem de DSS deve ser rotineira e integrada ao cuidado — não um formulário isolado — para orientar intervenções clínicas, sociais e administrativas. Este texto, destinado a profissionais de saúde, descreve diretrizes práticas para identificação, documentação estruturada e encaminhamento, com foco em prontuário eletrônico, encaminhamento social e uso de telemedicina como recursos complementares.
Por que triagem de determinantes sociais da saúde importa na atenção primária
Os DSS são as condições onde as pessoas nascem, crescem, trabalham, vivem e envelhecem. Sua identificação precoce na atenção primária permite:
- Personalizar planos de cuidado considerando barreiras reais, como insegurança alimentar, moradia precária ou transporte inadequado.
- Reduzir consultas não atendidas e internações evitáveis ao abordar causas sociais que complicam doenças crônicas.
- Conectar pacientes a redes de assistência social e programas comunitários, melhorando adesão e equidade em saúde.
Equipes que adotam modelos de cuidado baseados em valor encontram na triagem de DSS um componente crítico para melhorar qualidade e eficiência.
Como realizar a triagem de determinantes sociais da saúde: identificação, documentação e encaminhamento
O fluxo recomendado envolve três etapas: identificação, documentação estruturada no prontuário eletrônico e encaminhamento para redes de apoio. A seguir, ações práticas para cada etapa.
Identificação: perguntas e dinâmica da triagem
Adote perguntas curtas e padronizadas por domínio para não sobrecarregar a consulta. Domínios essenciais: moradia, alimentação/insegurança alimentar, transporte, apoio social, finanças, educação, emprego, segurança e acesso a serviços de saúde. Use linguagem não julgadora e garanta confidencialidade.
- Exemplos práticos: “Você tem alimentação suficiente para manter sua saúde?”; “Você tem onde morar de forma estável nas próximas semanas?”; “Como costuma chegar às consultas?”
- Formato sugerido: 1–3 perguntas por domínio, resposta sim/não ou escala rápida. Aplicação em pré‑consulta, sala de espera digital ou por agente comunitário aumenta cobertura.
Documentação: registro útil e seguro no prontuário eletrônico
Registre de forma objetiva e acionável, preferencialmente com campos estruturados no prontuário eletrônico para facilitar busca, relatórios e interoperabilidade.
- Use formulários padronizados com códigos para cada domínio DSS e campo livre para observações clínicas relevantes.
- Registre intervenções já realizadas (encaminhamento social, vale‑alimentação, transporte assistido) e a data prevista para reavaliação.
- Assegure consentimento informado para compartilhamento com serviços sociais e controle de acesso conforme legislação local.
Encaminhamento: redes de apoio e acompanhamento
Trate o encaminhamento como parte do plano de cuidado: identifique parceiros locais, defina responsável pelo acompanhamento e registre retornos no prontuário.
- Mapeie serviços públicos e organizações comunitárias (assistência social, centros de referência, programas de alimentação) e formalize fluxos quando possível.
- Estabeleça responsável pelo follow‑up (enfermeiro de família, assistente social, agente comunitário) e prazos claros para reavaliação (ex.: 4–12 semanas).
- Use telemedicina para monitoramento quando o transporte é uma barreira e registre consultas remotas como parte do fluxo de cuidado.
Manter retorno de informação entre serviço social e equipe clínica é fundamental para avaliar efetividade do encaminhamento.
Instrumentos e fluxos práticos para implementar triagem de determinantes sociais da saúde
Instrumentos curtos de triagem
Modelos breves facilitam a adoção: questionários por domínio, checklists de encaminhamento e escalas de vulnerabilidade social. Integre esses instrumentos ao fluxo digital da unidade com validação e alertas de reavaliação.
Fluxos de trabalho recomendados
Fluxo exemplar:
- Pré‑triagem (presencial ou remota) para identificação preliminar de DSS.
- Registro imediato no prontuário eletrônico durante a consulta.
- Avaliação clínica integrada ao DSS e definição de prioridades no plano de cuidado.
- Encaminhamento para redes de assistência social, nutrição, saúde mental, transporte e programas comunitários.
- Acompanhamento estruturado com datas e indicadores de resultado.
Recursos do blog que complementam a implementação (mantidos conforme original): IA na prática clínica, monitoramento da pressão arterial em idosos e telemedicina na prática clínica.
Integração multiprofissional e uso de tecnologia
Trabalhos com assistente social, nutricionista, farmacêutico, psicólogo e agentes comunitários tornam a triagem efetiva. Defina responsabilidades por domínio de DSS e promova treinamentos sobre sensibilidade cultural e ética em dados sociais.
Tecnologias como prontuário eletrônico com campos estruturados, sistemas de alerta e telemedicina aumentam a cobertura e a qualidade do acompanhamento.
Principais desafios na triagem de determinantes sociais da saúde e estratégias práticas
- Tempo de consulta: delegue pré‑triagem e utilize formulários digitais.
- Capacitação: treinamentos curtos, simulações e feedback local.
- Confidencialidade: políticas claras e consentimento informado.
- Encaminhamentos ineficazes: formalize parcerias e acordos com serviços sociais.
- Monitoramento: indicadores simples (número de triagens, proporção com encaminhamento concluído, mudanças em DSS).
Adote ciclos de melhoria contínua (PDCA) para ajustar fluxos e medir impacto.
Casos práticos que ilustram o impacto da triagem de determinantes sociais da saúde
- Caso 1: Paciente hipertenso com moradia instável e transporte precário — encaminhamento para assistência social, vale‑alimentação e teleconsultas para ajuste de terapia; resultado esperado: maior adesão e menos consultas de emergência.
- Caso 2: Idoso com diabetes e rede de apoio fraca — integração com assistência social para transporte, monitoramento remoto de glicemia e suporte nutricional; resultado esperado: melhor controle glicêmico.
- Caso 3: Depressão associada à insegurança alimentar — encaminhamento para saúde mental e programas comunitários de alimentação; resultado esperado: melhora do bem‑estar e da adesão ao tratamento.
Aspectos éticos e de confidencialidade na coleta de dados sociais
Coletar DSS exige respeito à privacidade e minimização de dados. Regras práticas:
- Obter consentimento informado para coleta e compartilhamento.
- Registrar apenas o necessário para o plano de cuidado.
- Usar sistemas com controle de acesso e logs de auditoria.
- Comunicar informações sem estigmatizar, com foco no apoio ao paciente.
Próximos passos para triagem de determinantes sociais da saúde
Ações imediatas para as próximas quatro semanas:
- Implantar um formulário padronizado de DSS no prontuário eletrônico e codificar domínios principais.
- Treinar a equipe para interpretar DSS clinicamente e integrar ao plano de cuidado.
- Mapear e formalizar parcerias com serviços sociais locais e manter lista de contatos atualizada.
- Incorporar telemedicina para follow‑up quando o deslocamento for barreira.
- Definir indicadores simples para monitorar impacto (triagens realizadas, encaminhamentos concluídos, mudanças observadas).
A triagem de determinantes sociais da saúde, bem integrada ao prontuário eletrônico e às redes de assistência social, melhora resultados clínicos, promove equidade em saúde e otimiza recursos da atenção primária. Para aprofundar fluxos remotos e suporte nutricional, consulte os links internos já presentes neste texto, como telemedicina na prática clínica e nutrição anti‑inflamatória na prática clínica.