Cessação do tabagismo
Parar de fumar é uma das intervenções com maior impacto na saúde individual: reduz risco de doenças cardiovasculares, câncer e mortalidade geral. Este guia direto e prático destina-se a profissionais de saúde e pacientes e descreve opções farmacológicas, intervenções breves e estratégias de apoio comportamental e digital para aumentar a taxa de abstinência.
Por que a cessação do tabagismo traz benefícios imediatos e a longo prazo
O tabagismo está associado a doença cardiovascular, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), cânceres e infecções respiratórias. Mesmo a redução do consumo melhora função pulmonar, circulação e qualidade de vida. A cessação também reduz fatores de risco como hipertensão e dislipidemia e melhora a tolerância ao exercício. A dependência à nicotina combina dependência física, condicionamento comportamental e fatores ambientais; por isso, intervenções que combinem farmacoterapia e apoio comportamental tendem a ter melhor resultado.
Abordagem farmacológica para cessação do tabagismo
As terapias com evidência incluem vareniclina, bupropiona e Terapia de Reposição de Nicotina (TRN). A escolha considera comorbidades, histórico de tentativas e preferências do paciente.
Vareniclina
A vareniclina é agonista parcial dos receptores nicotínicos e reduz tanto o prazer ao fumar quanto os sintomas de abstinência. Esquema usual: 0,5 mg/dia nos primeiros 3 dias, com aumento progressivo até 1 mg duas vezes ao dia; duração comum 12 a 24 semanas, com possibilidade de extensão. Efeitos adversos mais frequentes: náusea, insônia e alterações do humor. Pacientes com histórico de transtorno psiquiátrico devem ser monitorados de perto. Em gestação e lactação, decisão individualizada considerando risco/benefício.
Bupropiona
A bupropiona atua como inibidor da recaptação de dopamina e noradrenalina, reduzindo fissura e sintomas de abstinência. Esquema frequente: 150 mg/dia por 3 dias, seguido de 150 mg duas vezes ao dia por 7–12 semanas, com reavaliação. Efeitos adversos: insônia, boca seca, tontura; risco de convulsões em pacientes predispostos. Contraindicada em epilepsia não controlada, transtornos alimentares ativos e uso de IMAO.
Terapia de Reposição de Nicotina (TRN)
A TRN fornece doses controladas de nicotina por adesivos, gomas, pastilhas, sprays ou inaladores para reduzir sintomas de abstinência e controlar a fissura. Ajuste da dose conforme o nível de dependência (número de cigarros/dia). Protocolos comuns duram 8–12 semanas com redução gradual. Adesivos podem causar irritação cutânea; gomas e pastilhas podem causar desconforto gastrointestinal. A TRN é opção segura para muitos pacientes, incluindo aqueles com doença cardiovascular estável, quando usada sob orientação médica.
Uso combinado e decisões práticas
Combinações (p.ex., TRN mais bupropiona) podem ser consideradas em pacientes com fissura intensa, mas exigem monitorização por efeitos adversos e interações. Vareniclina mostrou, em vários estudos, maior eficácia isolada; porém a escolha deve ser individualizada, considerando tolerabilidade e comorbidades.
Intervenções breves na prática clínica
Intervenções de curta duração realizadas em consultas rotineiras aumentam significativamente a cessação. Uma abordagem prática resume-se em cinco passos: perguntar sobre tabagismo, aconselhar de forma clara e empática, avaliar prontidão para parar, assistir com plano e terapias, e agendar acompanhamento. Tradução prática dos 5 A’s: Perguntar, Aconselhar, Avaliar, Auxiliar e Acompanhar.
Estratégias rápidas para consulta
- Documente nível de dependência (cigarros/dia; tempo até o primeiro cigarro).
- Ofereça rapidamente as opções farmacológicas (vareniclina, bupropiona, TRN) e explique benefícios/efeitos adversos.
- Prescreva com instruções claras de dose e duração; alinhe expectativas sobre tempo até redução da fissura (1–2 semanas em média).
- Encaminhe para apoio comportamental ou programas estruturados e recursos educativos, por exemplo guia de educação terapêutica.
- Agende retorno em 2–4 semanas para revisar adesão, tolerabilidade e ajustar a terapia.
Apoio comportamental e integração com tecnologia
O apoio comportamental é essencial: identificação de gatilhos, técnicas de enfrentamento, registros diários e treinamento em manejo do estresse aumentam as chances de sucesso. Apps de cessação e plataformas digitais ajudam no rastreamento da abstinência e na manutenção da motivação. A combinação de aconselhamento com suporte digital tende a melhorar os resultados em comparação com intervenções isoladas.
Populações especiais e considerações de segurança
- Gestação e lactação: priorizar medidas não farmacológicas; a TRN pode ser considerada após avaliação obstétrica individualizada.
- Doença cardiovascular: cessação reduz risco de eventos; farmacoterapia pode ser utilizada com monitorização clínica.
- Insuficiência renal/hepática: ajuste de dose pode ser necessário, principalmente para TRN e outros fármacos com eliminação renal/hepática.
- Histórico psiquiátrico: monitorar humor e ideação suicida; discutir riscos e benefícios com equipe de saúde mental.
- Idosos: revisar polifarmácia e objetivos de cuidado; adaptar suporte conforme capacidade funcional.
Como montar um plano personalizado de cessação
Um plano individual considera nível de dependência, comorbidades, preferências pelo modo de entrega (adesivos, gomas, comprimidos, inaladores), histórico de tentativas e suporte disponível. Estabeleça metas realistas (por exemplo, data-alvo para abstinência em 4 semanas), plano para manejo de recaídas e reavaliação periódica a cada 2–4 semanas.
Aspectos práticos de monitoramento e segurança
Monitore efeitos adversos e sinais de alerta:
- Vareniclina: náusea, insônia, alterações do humor — suspenda se houver piora psiquiátrica significativa.
- Bupropiona: risco de convulsões em pacientes predispostos; evite em transtornos alimentares ativos e uso de IMAO.
- TRN: irritação cutânea por adesivos, desconforto GI por pastilhas/gomas; ajustar dose conforme necessidade.
Em todos os casos, revise interações medicamentosas em pacientes com polifarmácia e incentive comunicação aberta sobre efeitos adversos.
Resultados esperados, recaídas e continuidade do cuidado
A jornada de cessação frequentemente inclui recaídas. Reabra a conversa sem julgamentos, ajuste a estratégia e recomece quando necessário. A continuidade do cuidado — com educação terapêutica, acompanhamento e metas claras — é fundamental. Recursos sobre adesão terapêutica podem ajudar a estruturar o seguimento clínico.
Ações práticas imediatas para profissionais e pacientes
- Comece a abordagem sobre cessação na próxima consulta, mesmo que seja breve; use os 5 passos (Perguntar, Aconselhar, Avaliar, Auxiliar, Acompanhar).
- Discuta opções farmacológicas (vareniclina, bupropiona, TRN) de acordo com o histórico e preferências do paciente.
- Ofereça ou encaminhe para apoio comportamental e recursos digitais; considere programas estruturados de cessação e aplicativos de rastreio.
- Monitore adesão e efeitos adversos; ajuste o plano a cada 2–4 semanas conforme resposta clínica.
- Alinhe o plano de cessação com metas de saúde geral do paciente, incluindo estratégias de promoção da saúde cardiovascular, quando apropriado (promoção da saúde cardiovascular).
Resumo prático para a clínica
Combine uma escolha farmacológica baseada em evidência com intervenções breves na consulta, suporte comportamental contínuo e uso seletivo de tecnologia. A personalização do tratamento, o monitoramento ativo e o suporte ao paciente são as chaves para aumentar a taxa de abstinência e reduzir a carga das doenças relacionadas ao tabagismo.