O que é delirium em idosos: sinais, causas e manejo
Delirium é uma síndrome aguda de alteração da atenção e da cognição, com curso flutuante e início geralmente súbito. Em idosos, especialmente com comorbidades ou hospitalizados, o delirium é frequente e relacionado a pior prognóstico — maior mortalidade, tempo de internação prolongado, risco de quedas e declínio funcional. A detecção precoce e o manejo adequado reduzem morbidade e impacto sobre a independência do paciente.
Este texto destina-se a profissionais de saúde e a pacientes/cuidadores que buscam explicações claras e orientações práticas sobre sinais, avaliação, causas precipitantes e estratégias de manejo e prevenção.
Delirium em idosos: definição e importância clínica
O delirium caracteriza-se por alteração aguda da atenção, da consciência e da cognição, com flutuações ao longo do dia. Pode apresentar-se como quadro hiperativo (agitação, alucinações, desinibição) ou hipoativo (letargia, resposta reduzida), sendo este último facilmente subdiagnosticado. Diferencia-se de demência por início acelerado e curso normalmente reversível quando a causa subjacente é tratada.
Sinais de delirium em idosos
- Alteração súbita da atenção (dificuldade de manter foco).
- Desorientação no tempo e no espaço.
- Alterações no ciclo sono-vigília (insônia nocturna e sonolência diurna).
- Alterações perceptivas (alucinações visuais ou auditivas).
- Flutuações na cognição e no nível de consciência ao longo do dia.
- Comportamento agitado ou apático; fala acelerada ou pobreza de linguagem.
Fatores de risco e apresentação clínica
Os principais fatores de risco incluem idade avançada, demência prévia, polifarmácia, internação hospitalar recente, cirurgias, doença aguda grave, desidratação e déficits sensoriais (visão/audição). A polifarmácia e o uso de fármacos com efeito anticolinérgico, sedativos, opioides e benzodiazepínicos aumentam substancialmente o risco de delirium.
Avaliação rápida do delirium: triagem e exames
A avaliação inicial deve ser sistemática: reconhecer o quadro, buscar causas precipitantes e monitorar diariamente. Ferramentas validadas aumentam a sensibilidade do diagnóstico.
Instrumentos de triagem: 4AT e CAM-ICU
- 4AT: rápido, não exige treinamento extenso e avalia alerta, orientação, atenção e duração das alterações.
- CAM-ICU: indicado para pacientes não cooperantes ou em ventilação mecânica; útil em unidades de terapia intensiva.
- A triagem diária, especialmente na admissão, ajuda a detectar delirium hiponatremia-relacionado, por infecção ou por medicação.
Exames laboratoriais e de imagem
Objetivo: identificar precipitantes reversíveis. Exames comuns:
- Hemograma, marcadores de infecção (crp, procalcitonina quando indicado).
- Eletrólitos (sódio, potássio, cálcio, magnésio, fósforo), glicemia e função renal e hepática.
- Vitamina B12, folato e TSH quando indicado por quadro crônico ou sem causa aparente.
- Gasometria arterial/venosa se houver suspeita de hipóxia.
- Urina e hemoculturas se houver suspeita de infecção urinária ou sepse; radiografia de tórax se houver sintomas respiratórios.
- Tomografia de crânio em casos de déficit neurológico focal, traumatismo ou suspeita de AVC/hematoma.
A revisão de medicamentos deve ser parte imediata da avaliação: identificar fármacos delirígenos e reduzir ou substituir quando possível.
Etiologia: causas precipitantes comuns
O delirium costuma ser multifatorial. Causas frequentes em idosos:
- Infecções (pneumonia, infecção do trato urinário, sepse).
- Distúrbios metabólicos (hiponatremia, hiperglicemia, hipoglicemia, desidratação).
- Hipóxia ou insuficiência respiratória.
- Insuficiência renal ou hepática.
- Deficiências nutricionais (vitamina B12, folato).
- Intoxicações medicamentosas ou abstinência (álcool, sedativos).
- Pós-operatório, dor mal controlada, constipação, privação de sono.
Manejo do delirium em idosos
O manejo combina tratamento da causa precipitante e intervenções não farmacológicas que favoreçam segurança e reorientação.
Intervenções não farmacológicas (primeira linha)
- Reorientação frequente: relógio, calendário, fotos familiares e explicações simples e repetidas.
- Higiene do sono: reduzir ruído e luz à noite, evitar cochilos prolongados diurnos.
- Correção da desidratação e nutrição adequada; monitorar ingestão hídrica.
- Suporte sensorial: garantir uso de óculos e aparelhos auditivos.
- Mobilização precoce e fisioterapia para reduzir imobilidade e risco de complicações.
- Avaliação e controle eficaz da dor.
- Evitar procedimentos e dispositivos invasivos desnecessários (cateteres, sondas).
Gerenciamento farmacológico
Medicamentos devem ser usados com parcimônia. Indicadores:
- Antipsicóticos (por exemplo, haloperidol oral/IM em doses baixas) apenas quando há risco imediato de dano ou quando a agitação impede cuidados essenciais. Monitorar intervalo QT e efeitos adversos.
- Evitar benzodiazepínicos como primeira opção, exceto em abstinência alcoólica ou convulsões.
- Rever e reduzir sedativos, opioides e outros fármacos potencialmente delirígenos.
Quando solicitar avaliação especializada
Encaminhar para geriatria, neurologia ou cuidados intensivos se o delirium for grave, persistente, associado a déficits neurológicos focais ou se houver suspeita de condição aguda grave (AVC, sangramento intracraniano, sepse).
Prevenção de delirium em ambientes clínicos
Protocolos de prevenção reduzirem incidência e gravidade do delirium. Medidas úteis:
- Implementar triagem rotineira (4AT, CAM-ICU) em pacientes idosos na admissão e durante a internação.
- Revisão periódica de medicações para minimizar polifarmácia e retirar anticolinérgicos e benzodiazepínicos desnecessários.
- Aplicar o ABCDEF bundle (foco em despertar e ventilação, monitorização do delirium, mobilidade precoce e envolvimento familiar).
- Garantir suporte sensorial, hidratação e controle metabólico precoce (por exemplo, correção de hiponatremia).
Para aprofundar estratégias de prevenção e manejo em atenção primária, veja os recursos sobre rastreio e manejo da demência e promoção da saúde mental na atenção primária. Conteúdos sobre prevenção de quedas também são relevantes no cuidado geriátrico, por exemplo prevenção de quedas em idosos.
Manejo e orientações finais
O delirium em idosos é um sinal de vulnerabilidade clínica que exige ação rápida: identificar precipitantes (infecção, distúrbios metabólicos, hipoxia, medicações), aplicar medidas não farmacológicas de reorientação e segurança, e usar medicamentos apenas quando necessário para controle de comportamento perigoso. A integração entre equipes — enfermagem, medicina interna, geriatria, fisioterapia e fonoaudiologia — e o envolvimento da família aumentam as chances de recuperação. Planeje seguimento após alta com avaliação cognitiva e reabilitação funcional para reduzir risco de recorrência.
Notas práticas: implemente triagem diária com 4AT ou CAM-ICU, realize reconciliação medicamentosa completa na admissão, priorize hidratação e correção metabólica rápida e mobilização precoce. Para casos clínicos e recursos adicionais, consulte os links indicados sobre rastreio e manejo da demência, promoção da saúde mental e prevenção de quedas.