Dor pélvica crônica na mulher: avaliação e encaminhamentos

Dor pélvica crônica na mulher: avaliação e encaminhamentos

Introdução

Você atende mulheres com dor na região inferior do abdome há meses ou anos? A dor pélvica crônica (persistência ≥6 meses) afeta 15–20% das mulheres em idade reprodutiva e causa grande impacto funcional e psicológico. Para clínicos, ginecologistas e equipes multidisciplinares, reconhecer padrões, priorizar exames e decidir encaminhamentos é essencial para reduzir sofrimento e evitar intervenções desnecessárias (fonte epidemiológica).

Definição e epidemiologia rápidas

Dor pélvica crônica é dor localizada na pelve ou região inferior do abdome, persistente por pelo menos seis meses, associada à limitação das atividades ou sofrimento emocional. A prevalência estimada (15–20%) torna o problema frequente na prática ginecológica e em atenção primária.

Avaliação diagnóstica: como organizar a investigação

Anamnese dirigida

Uma anamnese estruturada determina a hipótese diagnóstica e o plano de investigação. Perguntas essenciais:

  • Início, duração, intensidade, padrão cíclico vs contínuo, relação com menses, atividade sexual e evacuação.
  • Sintomas associados: dispareunia, menorragia, alteração intestinal (sugestiva de síndrome do intestino irritável), urgência/algúria (possível cistite intersticial), padrão neuropático (queima, choque).
  • História de cirurgias abdominais/pélvicas (adesões), infertilidade, e impacto funcional/saúde mental.

Exame físico e testes iniciais

  • Exame abdominal completo e exame especular e bimanual, avaliando pontos dolorosos, massa palpável e tensão do assoalho pélvico.
  • Triagem laboratorial: hemograma, PCR, urina e urocultura quando indicado; testes de ITS conforme risco.
  • Imagem inicial: ultrassonografia transvaginal (preferencial) para avaliar miomas, adenomiose suspeita, cistos ovarianos e malformações anatômicas.

Quando pensar em exames complementares e laparoscopia

Se a história e exames sugerem endometriose profunda, massas palpáveis, infertilidade associada ou dor refratária a tratamento empírico, considere ressonância magnética pélvica e encaminhamento ginecológico para discussão de laparoscopia diagnóstica/terapêutica. A laparoscopia continua sendo padrão ouro para diagnóstico definitivo de algumas causas (p. ex. endometriose) quando a imagem não for conclusiva.

Principais etiologias: organizar por origem

  • Ginecológicas: endometriose, adenomiose, miomas, aderências pélvicas, varizes pélvicas, doença inflamatória pélvica crônica.
  • Urológicas: cistite intersticial, bexiga dolorosa, infecções urinárias recorrentes.
  • Gastrointestinais: síndrome do intestino irritável, constipação crônica, doença inflamatória intestinal.
  • Músculoesqueléticas e neurológicas: disfunção do assoalho pélvico, espasmo muscular, compressões nervosas e sensibilização central.

Manejo inicial prático na atenção primária e ambulatorial

Diretrizes gerais

Adote uma abordagem multidisciplinar desde cedo: combinar medidas farmacológicas, fisioterapia e intervenções psicológicas reduz tempo de sofrimento e evita encaminhamentos tardios. Diretrizes nacionais e revisões (por exemplo, posicionamentos de sociedades como a FEBRASGO) reforçam avaliação estruturada e encaminhamento conforme sinais de alarme.

Tratamento farmacológico e não farmacológico

  • Analgésicos: AINEs em curto prazo para crises; avaliação de risco gastrointestinal e cardiovascular. Evitar uso crônico sem reavaliação.
  • Tratamentos hormonais: tentativa empírica de supressão estrogênica é razoável quando se suspeita endometriose (contraceptivos combinados contínuos, progestágenos, DIU liberador de levonorgestrel), avaliando contraindicações e plano reprodutivo.
  • Neuromoduladores: antidepressivos tricíclicos (p. ex. amitriptilina), duloxetina ou gabapentinoides para componente neuropático ou dor centralizada.
  • Fisioterapia pélvica: treino e relaxamento do assoalho pélvico, biofeedback e técnicas miofasciais são intervenções de primeira linha para disfunção muscular; encaminhe a fisioterapeuta pélvico com experiência.
  • Intervenções psicológicas: terapia cognitivo-comportamental, estratégias de controle de dor e abordagem de comorbidades psiquiátricas.

Estratégia de tentativa terapêutica

Iniciar medidas conservadoras e reavaliar em 6–12 semanas. Se houver melhora, manter e progredir com reabilitação; se não, escalonar ou encaminhar para especialista. Documente resposta e efeitos adversos.

Encaminhamentos: quem e quando

Critérios práticos para encaminhar:

  • Suspeita de endometriose profunda, massa pélvica, infertilidade concomitante ou dor incapacitante → encaminhar ao ginecologista com prioridade.
  • Sinais urinários predominantes (urgência, dor vesical crônica) sem melhora → considerar urologia e avaliação para cistite intersticial e manejo especializado.
  • Predominância intestinal ou sintomas que sugerem SII refratária → encaminhar a gastroenterologia.
  • Sinais de sensibilização central, falha de abordagens convencionais ou necessidade de intervenção multimodal → encaminhar para clínica de dor/crônica multidisciplinar e fisioterapia especializada.

Para apoiar fluxos locais e integração com reabilitação, consulte conteúdos sobre abordagem integrada da dor crônica e diretrizes de encaminhamento disponíveis no blog: veja material sobre abordagem integrada da dor crônica e qualidade de vida, protocolos de reabilitação multimodal e orientações específicas em dor pélvica crônica: avaliação e encaminhamento. Quando os sintomas urinários dominam, utilidade prática pode ser encontrada em guias sobre incontinência urinária feminina.

Indicações cirúrgicas e expectativas

A cirurgia (laparoscopia com ressecção de lesões endometrióticas, video-laparoscopia para liberação de aderências ou tratamento de miomas) é indicada quando há correlação anatômica clara com dor, falha do manejo conservador e quando benefícios superam riscos. Explique à paciente que a dor pode ter componentes múltiplos e que a cirurgia pode não resolver completamente a dor se houver sensibilização central ou comorbidades não resolvidas.

Mensuração do impacto e acompanhamento

Use escalas validadas (EVA, questionários de qualidade de vida, inventários para disfunção do assoalho pélvico) para monitorizar resposta. Reavalie periodicamente o plano terapêutico e coordene encaminhamentos interdisciplinares para otimizar funcionalidade e bem-estar.

Fechamento e orientações práticas

Na prática clínica: 1) realize anamnese e exame direcionados; 2) inicie medidas conservadoras (analgésicos judiciosos, tentativa hormonal quando indicada, fisioterapia pélvica); 3) encaminhe precocemente quando houver suspeita de endometriose profunda, sintomas urológicos predominantes como cistite intersticial ou falha terapêutica; 4) utilize abordagem multidisciplinar com fisioterapeutas, psicólogos e serviços de dor. Para leitura complementar sobre epidemiologia e diretrizes, consulte a revisão na enciclopédia médica, as recomendações de sociedades como a FEBRASGO e materiais acadêmicos disponíveis no repositório da USP.

Palavras-chave aplicadas no texto: endometriose, cistite intersticial, fisioterapia pélvica, síndrome do intestino irritável, abordagem multidisciplinar.

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