Epistaxe em adultos: protocolo prático para atendimento seguro
Público-alvo: profissionais de saúde. Protocolo baseado em evidências para manejo da epistaxe em adultos em urgência, consultório e atenção primária, com critérios claros de encaminhamento.
Epistaxe em adultos: panorama e importância clínica
A epistaxe (sangramento nasal) é uma queixa comum que varia de autolimitada a potencialmente grave. Na maioria dos adultos, o sangramento é anterior, geralmente originado no plexo de Kiesselbach; episódios posteriores são menos frequentes e podem exigir intervenção endoscópica ou embolização. Objetivos imediatos: controlar o sangramento, preservar via aérea e avaliar estabilidade hemodinâmica.
Fisiologia e classificação: epistaxe anterior e posterior
Classificar o sangramento ajuda a orientar o manejo:
- Epistaxe anterior: origem na mucosa anterior (plexo de Kiesselbach). Mais comum, responde à compressão, vasoconstritores tópicos e cauterização localizada.
- Epistaxe posterior: origem em vasos profundos (por exemplo, artéria esfenopalatina). Tende a ser mais volumosa e recorrente, frequentemente requer tamponamento posterior, cirurgia endoscópica ou embolização.
Avaliação inicial do paciente com epistaxe
Siga os princípios ABC: via aérea, respiração e circulação, com foco em controle rápido do sangramento.
- Via aérea: avalie risco de aspiração. Posicione o paciente levemente inclinado para frente e com o queixo baixo para impedir deglutição de sangue.
- Sinais vitais e perfusão: monitore pressão arterial, frequência cardíaca, saturação e estado mental. Reponha volume se houver instabilidade.
- História dirigida: pergunte por trauma nasal, uso de anticoagulantes (varfarina, dabigatrana, apixabana, rivaroxabana), antiagregantes (ácido acetilsalicílico), distúrbios de coagulação, rinite, uso prolongado de descongestionantes tópicos e sintomas sistêmicos.
- Exame físico: inspeção com boa iluminação; identifique foco anterior visível ou suspeita de sangramento posterior. Evite manipulações agressivas sem anestesia local.
Encaminhe imediatamente para otorrinolaringologia ou emergência se houver: sangramento persistente após compressão adequada, suspeita de epistaxe posterior, instabilidade hemodinâmica, trauma facial com fratura, ou sangramento incontrolável em usuário de anticoagulantes.
Protocolo de atendimento inicial (ambulatórios e urgência)
Materiais essenciais: gaze, pinça nasal, solução vasoconstritora (oximetazolina/nafazolina/fenilefrina), anestésico local, nitrato de prata, tampões (Merocel, Gelfoam), kits para tamponamento com balão, e monitorização de sinais vitais.
Etapa 1 — contenção imediata e reavaliação
- Posicionamento: sentar-se, inclinar levemente para frente.
- Compressão direta: comprimir a narina afetada na porção cartilaginosa anterior por 10 minutos contínuos; só liberar para avaliar se cessou.
- Vasoconstritor tópico: após compressão, aplicar oximetazolina 0,05% (1–2 jatos) ou outro vasoconstritor; monitorar pressão arterial em pacientes com cardiopatia ou hipertensão grave.
- Analgésicos e orientação: oferecer analgesia simples (paracetamol ou dipirona) e instruir evitar esforço, assoar ou manipular o nariz nas próximas 24–48 horas.
Etapa 2 — cauterização local quando indicada
- Cauterização química: nitrato de prata é o agente de escolha para pontos visíveis após aplicação de anestésico e secagem da mucosa.
- Cauterização elétrica: indicada quando a cauterização química falha ou quando o ponto sangrante é mais amplo; requer anestesia local e preparo adequado.
- Pós-procedimento: manter a área seca, evitar assoar com força, e usar soro fisiológico tópico e lubrificantes nasais para prevenir fissuras.
Etapa 3 — tamponamento nasal (packing)
- Indicação: sangramento que não cede com medidas anteriores ou epistaxe posterior.
- Técnica e materiais: tamponamento anterior com Merocel ou Gelfoam; para sangramentos posteriores, considerar balão nasofaríngeo ou tamponamento posterior conforme protocolo local.
- Antibioticoprofilaxia: considerar profilaxia se o tampão permanecer por mais de 24–48 horas, conforme risco e protocolo institucional.
- Monitorização: observar sinais vitais, desconforto respiratório e sinais de infecção; remoção por profissional capacitado.
Etapa 4 — manejo de anticoagulantes e fatores de risco
- Anticoagulantes/antiagregantes: comunique o médico que acompanha a anticoagulação para avaliar necessidade de suspensão temporária ou reversão, ponderando risco tromboembólico.
- Hipertensão: tratar picos pressóricos agudos e orientar controle crônico da pressão arterial.
- Hidratação e umidificação: incentivar soro fisiológico em spray e umidificação ambiental para prevenir ressecamento nasal.
Fluxo de encaminhamento e sinais de gravidade
Encaminhe para avaliação especializada quando houver:
- Sangramento persistente após 15–20 minutos de compressão adequada.
- Sangramento posterior suspeito/confirmado, com sinais de hipoperfusão ou anemia aguda.
- Trauma facial com suspeita de fratura ou lesão associada.
- Uso de anticoagulantes com sangramento inconsolável.
- Recorrência frequente sugerindo etiologia subjacente (tumor nasal, malformação vascular, coagulopatia).
Prevenção de recorrência e orientações ao paciente
Medidas para reduzir recidiva incluem:
- Humidificação: uso de umidificadores em ambientes secos e aplicação regular de solução salina nasal.
- Evitar irritantes: limitar uso prolongado de descongestionantes tópicos, evitar coçar ou cutucar o nariz.
- Controle de comorbidades: manejo adequado de hipertensão, avaliação hematológica para coagulopatias e revisão da terapêutica anticoagulante quando indicado.
- Educação: ensinar técnica correta de compressão anterior e sinais de alarme que justificam retorno imediato.
Casos especiais
- Idosos: maior risco por fragilidade da mucosa e polifarmácia; monitorar anticoagulação e evitar procedimentos desnecessários.
- Distúrbios de coagulação: solicitar hemograma e testes de coagulação, envolvendo hematologia quando necessário.
- Anticoagulantes diretos ou warfarina: decisões sobre reversão devem ser individualizadas e feitas em conjunto com equipe responsável pela anticoagulação.
Referências práticas e leituras complementares
Para aprofundar protocolos e diretrizes, consulte materiais relacionados do nosso blog, por exemplo: protocolos clínicos e diretrizes práticas (protocolos clínicos e diretrizes práticas), manejo de comorbidades respiratórias que podem influenciar o cuidado nasal (manejo de asma em atendimento ambulatorial) e abordagem de infecções respiratórias agudas (infecções respiratórias agudas na atenção primária), que complementam a avaliação de pacientes com epistaxe e comorbidades. Esses conteúdos servem como apoio para decisões clínicas e encaminhamentos.
Epistaxe em adultos: recomendações para prática clínica
Epistaxe em adultos deve ser abordada de forma sistemática: identificar tipo (anterior vs posterior), estabilizar via aérea e hemodinâmica, iniciar compressão e vasoconstritores, considerar cauterização ou tamponamento conforme necessidade e avaliar fatores de risco, especialmente o uso de anticoagulantes e hipertensão. A maior parte dos casos é manejável em ambiente ambulatorial seguindo este protocolo; casos refratários, volumosos ou com instabilidade exigem encaminhamento urgente a otorrinolaringologia. A prevenção inclui humidificação, controle de comorbidades e educação do paciente para reduzir recorrências.