A gastroparesia é um quadro clínico em que ocorre atraso no esvaziamento gástrico em ausência de obstrução mecânica. Este texto, dirigido a profissionais de saúde e a pacientes bem informados, aborda definição, fisiopatologia, diagnóstico diferencial, opções terapêuticas e orientações práticas para acompanhamento e encaminhamento.
O que é gastroparesia
Gastroparesia caracteriza-se pelo esvaziamento gástrico lento, manifestando-se por plenitude precoce, saciedade rápida, náuseas, vômitos e perda ponderal. Do ponto de vista fisiopatológico, envolve disfunção da musculatura gástrica, alteração das células intersticiais de Cajal, neuropatia autonômica ou resposta inflamatória que prejudica a coordenação motor-neural do estômago.
Sintomas de gastroparesia
- Plenitude precoce e saciedade rápida
- Náuseas persistentes e vômitos
- Distensão abdominal e dor abdominal de intensidade variável
- Perda de apetite e perda de peso não intencional
- Em pacientes com diabetes, flutuações glicêmicas podem agravar os sintomas
O quadro pode ser confundido com dispepsia funcional ou refluxo gastroesofágico; por isso, a suspeita clínica deve orientar a investigação complementar.
Fatores de risco e causas
- Diabetes mellitus (mais frequente causa identificada, por neuropatia autonômica)
- Cirurgia gástrica prévia que altera a anatomia ou a motilidade
- Uso de medicamentos que retardam o esvaziamento (opióides, anticolinérgicos, alguns antipsicóticos)
- Doenças sistêmicas com neuropatia ou miopatia
- Causas idiopáticas e pós-infecciosas
Diagnóstico: confirmação e cintilografia de esvaziamento gástrico
Passos clínicos iniciais
- História detalhada com ênfase em sinais de atraso do esvaziamento, perda de peso, uso de fármacos e controle glicêmico.
- Exame físico direcionado para sinais de desnutrição e desidratação.
- Excluir obstrução mecânica quando indicado, por meio de endoscopia digestiva alta (EDA).
Exames-chave
- Cintilografia de esvaziamento gástrico: padrão-ouro para quantificar o tempo de esvaziamento após refeição padronizada.
- Teste respiratório com carbono-13 (C-13) como alternativa quando a cintilografia não estiver disponível.
- Avaliação da função autonômica em pacientes com suspeita de neuropatia (especialmente em diabetes).
- Exames laboratoriais para avaliar estado nutricional, eletrólitos, função tireoidiana e hepática.
O diagnóstico combina história compatível, documentação objetiva de atraso no esvaziamento e exclusão de obstrução. Pacientes com sintomas típicos e exames normais podem receber manejo empírico com monitorização da resposta.
Tratamento e manejo prático
A abordagem é multidisciplinar: mudanças dietéticas, suporte nutricional, farmacoterapia e, em casos refratários, intervenções endoscópicas ou cirúrgicas.
Dieta e nutrição clínica
- Refeições menores e mais frequentes, alimentos de fácil digestão e textura macia.
- Reduzir gorduras e fibras insolúveis que retardam o esvaziamento; priorizar proteínas magras e líquidos nutricionais quando necessário.
- Acompanhamento com nutricionista para prevenir desnutrição e planejar suplementação vitamínica.
Para orientação prática sobre estratégia alimentar em doenças crônicas, veja o material sobre nutrição prática.
Medicamentos
- Procinéticos: metoclopramida é frequentemente usada para melhorar o esvaziamento, lembrando limitações de uso prolongado devido a efeitos extrapiramidais; domperidona pode ser opção conforme disponibilidade e risco cardíaco.
- Antieméticos para controle de náuseas e vômitos, escolhidos conforme perfil de efeitos adversos.
- Otimização do controle glicêmico em pacientes com diabetes, pois hiperglicemia pode piorar a motilidade gástrica.
- Revisão e ajuste de medicamentos que retardam o esvaziamento gástrico sempre que possível.
Intervenções avançadas
- Em casos refratários, considerar estimulação elétrica gástrica ou terapias endoscópicas/cirúrgicas após avaliação multidisciplinar.
- Suporte nutricional via sonda de alimentação enteral (jejunostomia) quando a ingestão oral for insuficiente.
Manejo no consultório e critérios para encaminhar
- Avaliação inicial: confirmar suspeita clínica, revisar medicamentos e avaliar risco nutricional.
- Plano individualizado com médico e nutricionista e monitoramento por diário de sintomas e alimentação.
- Encaminhar para gastroenterologia especializada ou unidade de motilidade se houver: sintomas refratários por 8–12 semanas, comprometimento nutricional significativo, suspeita de obstrução ou necessidade de terapias avançadas.
Ferramentas de comunicação e estratégias para melhorar adesão podem ser úteis; consulte o conteúdo sobre melhorando adesão terapêutica em consultório e princípios aplicáveis em dispepsia, adaptando-os ao cenário da gastroparesia.
Orientações práticas para equipes e pacientes
Para profissionais: estruture um plano escalonado — investigação para excluir obstrução, confirmação funcional (cintilografia de esvaziamento gástrico quando possível), intervenções dietéticas e farmacológicas, com encaminhamento precoce se houver falha terapêutica ou risco nutricional. Para pacientes: mantenha diário de alimentação e sintomas, cumpra o plano dietético e farmacológico, e procure avaliação se houver vômitos persistentes, perda de peso rápida ou sinais de desidratação.
A integração entre médico, nutricionista e, quando indicado, endocrinologista ou serviço de motilidade é determinante para melhorar sintomas, prevenir complicações e otimizar qualidade de vida em pacientes com gastroparesia.