Gestão da doença renal crônica na atenção primária: monitoramento, metas e encaminhamentos
A doença renal crônica (DRC) é prevalente e associada a maior risco cardiovascular, hospitalizações e perda de qualidade de vida. Na atenção primária, o objetivo é identificar precocemente a doença, estratificar risco e aplicar intervenções que retardem a progressão — integrando controle da pressão arterial, manejo glicêmico, avaliação da proteinúria e encaminhamento oportuno para nefrologia.
Doença renal crônica: identificação e estratificação
Diagnosticar e estratificar a DRC baseia‑se na combinação da taxa de filtração glomerular estimada (TFG) e na presença de albuminúria/proteinúria. A classificação em estágios orienta seguimento e condutas terapêuticas, conforme recomendações internacionais (KDIGO) e revisões nacionais. Para revisão prática sobre estratificação por TFG, consulte a literatura e diretrizes especializadas.
Monitoramento na atenção primária
O monitoramento deve ser individualizado segundo estágio da DRC e comorbidades. Elementos essenciais:
TFG e albuminúria
- Solicitar creatinina e calcular TFG com equação validada; repetir conforme risco (pelo menos anual em estágios 1–3 e com maior frequência em estágios avançados).
- Avaliar albuminúria por relação albumina/creatinina urinária (ACR) ou proteinúria de 24 horas quando indicado; persistentemente elevada, aumenta o risco de progressão.
Pressão arterial e glicemia
- Medir pressão arterial corretamente em todas as consultas; metas geralmente 130/80 mmHg em pacientes com proteinúria ou doença renal crônica, salvo indicações contrárias.
- Em pessoas com diabetes, monitorar HbA1c e glicemia capilar; manter controle glicêmico individualizado (meta acostumada ≈ 7% na maioria dos pacientes, ajustando por risco hipoglicêmico).
Estudos brasileiros sobre monitoramento e indicadores de função renal estão disponíveis em revisões como a publicada no SciELO, que reforça a importância da TFG e da proteinúria na prática clínica (revisão no SciELO).
Metas terapêuticas na DRC
Definir metas claras facilita o acompanhamento e a decisão por ajustes terapêuticos:
- Controle pressórico: meta usual <130/80 mmHg em pacientes com proteinúria; adotar bloqueadores do sistema renina‑angiotensina (IECA ou BRA) quando indicados, monitorando creatinina e potássio.
- Redução da proteinúria: objetivo de reduzir a excreção urinária por intervenções farmacológicas e não farmacológicas.
- Glicemia: controle individualizado da hemoglobina glicada para reduzir risco de progressão em diabéticos.
- Controle lipídico e risco cardiovascular: uso de estatinas conforme risco global e presença de comorbidades.
Para estratégias farmacológicas e de prevenção cardiovascular integradas à DRC, veja orientações sobre hipertensão e manejo cardiovascular em atenção primária, que complementam o cuidado renal (manejo da hipertensão).
Encaminhamentos e critérios para avaliação nefrológica
Nem todo paciente com TFG reduzida precisa de avaliação imediata por nefrologia, mas existem sinais de alerta para encaminhamento:
- TFG < 30 mL/min/1,73 m² (estágios 4–5) — encaminhar para avaliação especializada.
- Proteinúria persistente > 300 mg/dia ou ACR elevado apesar de terapia otimizada.
- Queda rápida e inexplicada da TFG (ex.: redução ≥ 25% ou queda sustentada em semanas/meses).
- Distúrbios hidroeletrolíticos ou acidobásicos refratários, anemia sintomática difícil de controlar ou refratariedade às intervenções convencionais.
- Suspeita de doença renal hereditária ou sinais sugestivos de glomerulonefrite ativa (hematúria macroscópica, edema intenso, síndrome nefrítica).
Quando houver dúvida diagnóstica ou necessidade de terapias avançadas (diálise, preparação para transplante, biópsia renal), a comunicação com nefrologia deve ser célere e estruturada. Para casos específicos como doença renal policística, o encaminhamento precoce é recomendado — leia mais sobre avaliação de doenças renais específicas no texto sobre doença renal policística.
Intervenções práticas na atenção primária
- Revisar medicamentos que podem agravar função renal (AINEs, contraste iodado, alguns antimicrobianos).
- Orientar controle de peso, sedentarismo e dieta com sódio reduzido; considerar suporte nutricional em estágios avançados.
- Monitorar potássio e creatinina após início ou ajuste de IECA/BRA e orientar sobre sinais de hiperpotassemia.
- Integrar equipe multiprofissional: enfermagem, nutrição, farmacologia clínica e educação em autocuidado.
Ferramentas digitais e protocolos locais ajudam a padronizar seguimento. Artigos sobre monitoramento contínuo e estratégias em atenção primária podem apoiar a implantação de fluxos locais (monitoramento da DRC).
Resumo e recomendações práticas
Na atenção primária, priorize identificação precoce da DRC por TFG e albuminúria, controle rigoroso da pressão arterial e glicemia, redução da proteinúria com IECA/BRA quando indicado e avaliação das causas secundárias. Encaminhe para nefrologia pacientes com TFG < 30 mL/min/1,73 m², proteinúria refratária ou sinais de comprometimento sistêmico. Manter comunicação ativa com a rede de atenção e atualizar protocolos locais com base em diretrizes (KDIGO) e sociedades nacionais fortalece a segurança do paciente.
Referências externas selecionadas para aprofundamento: diretrizes KDIGO sobre DRC (KDIGO — CKD), posição da Sociedade Brasileira de Nefrologia sobre manejo e encaminhamentos (Sociedade Brasileira de Nefrologia) e revisão brasileira sobre monitoramento de função renal publicada no SciELO (revisão SciELO).
Para apoio a condutas clínicas integradas e fluxos de encaminhamento, consulte também materiais sobre encaminhamentos na DRC e conteúdo complementar sobre hipertensão na atenção primária (diretrizes de hipertensão).
Manter a prática baseada em evidências, com monitoramento organizado e comunicação entre níveis de atenção, reduz eventos adversos e melhora resultados a longo prazo para pessoas com DRC.