Rastreamento e manejo do diabetes tipo 2 na APS
Introdução
Como identificar pacientes com risco de diabetes mellitus tipo 2 na atenção primária e garantir que alcancem metas terapêuticas seguras e eficazes? O diagnóstico precoce, o controle glicêmico e a educação em saúde são pilares que reduzem complicações e hospitalizações. Este artigo, direcionado a profissionais de saúde, sintetiza critérios de rastreamento, metas, estratégias de monitorização e orientações práticas para a rotina da atenção primária à saúde.
1. Rastreamento e diagnóstico na atenção primária
Quem rastrear e com que periodicidade
Priorize rastreamento em adultos com fatores de risco: idade ≥40 anos (ou mais jovem na presença de obesidade/IMC elevado), história familiar, sedentarismo, síndrome metabólica, hipertensão, dislipidemia, antecedente de glicemia alterada ou história de intolerância à glicose. Em indivíduos sem fatores de risco, considerar rastrear a cada 3 anos a partir dos 40 anos.
Testes diagnósticos e critérios
- Glicemia de jejum (FG): ≥126 mg/dL em duas amostras ou uma amostra com quadro clínico compatível.
- Hemoglobina glicada (HbA1c): ≥6,5% para diagnóstico (atenção a condições que interferem no resultado: hemoglobinopatias, anemia).
- Teste de tolerância oral à glicose (TOTG) 75 g: glicemia de 2 horas ≥200 mg/dL.
Use exames confirmatórios em assintomáticos. Para triagem inicial, a HbA1c é prática e conveniente, mas combine com glicemia de jejum quando houver dúvidas. Para referência local e fluxos do SUS, consulte o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Ministério da Saúde, que detalha fluxos de atenção no SUS.
2. Metas terapêuticas e monitoramento
Metas glicêmicas e parâmetros complementares
A maioria dos pacientes adultos com DM2 deve ter HbA1c alvo <7%, individualizando conforme idade, comorbidades, risco de hipoglicemia e expectativa de vida. Além do controle glicêmico, monitore e trate:
- Pressão arterial: meta individualizada (frequentemente ≈130/80 mmHg, avaliar risco cardiovascular).
- Lipídios: avaliar risco aterosclerótico e instaurar terapia antiplaquetária/estatinas conforme orientação cardiometabólica.
- Função renal (creatinina/eGFR) e albuminúria anual.
As diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes reforçam a necessidade de metas integradas e acompanhamento multifatorial.
Frequência de monitorização
- HbA1c: a cada 3 meses enquanto não estiver em meta ou ao ajustar terapêutica; a cada 6 meses se estável em meta.
- Auto-monitorização glicêmica capilar: orientar conforme risco de hipoglicemia, uso de insulina e mudanças terapêuticas.
- Monitorização contínua de glicose (CGM): considerar para pacientes com hipoglicemias recorrentes ou necessidade de dados detalhados — ver recursos de CGM aplicáveis à atenção primária em texto especializado.
Para discussão prática sobre CGM na atenção primária, veja post específico sobre monitoramento contínuo de glicose em DM2 na primaria.
3. Manejo farmacológico e integração da equipe
Escolhas iniciais e escalonamento
A metformina permanece como primeira linha na maioria dos pacientes, salvo contraindicações. Individualize com base em comorbidades:
- Sulfonilureias quando o acesso a outras classes for limitado (avaliar risco de hipoglicemia).
- Inibidores de SGLT2: considere em presença de doença cardiovascular ou renal; benefícios cardiovasculares e renais são documentados.
- Agonistas do GLP-1 e insulina: indicados conforme necessidade de redução mais intensa de HbA1c ou situações específicas.
Para decisões baseadas em disponibilidade e critérios do SUS, integre as recomendações locais e o PCDT. A equipe multiprofissional (médico, enfermeiro, nutricionista, agente comunitário) é essencial para adesão e ajuste terapêutico.
Segurança e adesão
- Rever medicações que aumentem risco de hipoglicemia (polifarmácia), especialmente em idosos.
- Rastrear e tratar efeitos adversos; promover adesão terapêutica com material em linguagem acessível e planos de ação.
Recursos sobre adesão e estratégias de acompanhamento podem ser encontrados em textos sobre adesão terapêutica na atenção primária.
4. Educação do paciente e intervenções não farmacológicas
Abordagem prática na consulta
A educação em saúde deve ser estruturada: objetivos de cuidado, plano de alimentação e atividade, reconhecimento de hipoglicemia, autocuidado dos pés e calendário de exames. Utilize materiais visuais e planos de metas SMART (específicos, mensuráveis, atingíveis, relevantes, temporais).
Estilo de vida e encaminhamentos
- Promover perda de peso quando indicada e prescrever atividade física regular.
- Encaminhar para programas de nutrição e atividade quando disponível; ver orientações práticas em nutrição e atividade física na prevenção cardiovascular.
5. Monitoramento de complicações e critérios de referência
Inclua avaliação anual de pé (inspeção, sensibilidade), fundo de olho (encaminhar conforme disponibilidade ou telemedicina), creatinina/eGFR e albuminúria. Encaminhe para especialistas quando houver perda rápida da função renal, retinopatia proliferativa, úlcera de pé complicada ou necessidade de terapias especializadas.
Fechamento e orientações práticas
Na atenção primária à saúde, uma abordagem estruturada de rastreamento, metas individualizadas de controle glicêmico, monitorização regular e educação do paciente reduz complicações e otimiza resultados. Use protocolos locais (PCDT) e diretrizes nacionais e internacionais como referência prática: o PCDT do Ministério da Saúde, as diretrizes da SBD e as recomendações regionais como o HEARTS-D da OPAS. Integre a equipe, estruture recalls e use educação direcionada para melhorar adesão e alcançar metas terapêuticas. Para guias práticos e fluxos locais, consulte também o post sobre manejo do diabetes tipo 2 na atenção primária e recursos relacionados no blog.