Vus em testes genéticos: guia prático para interpretação

Variantes de Significado Incerto (VUS) são um desafio frequente na prática da genética clínica. Com a expansão de testes de próxima geração, aumentou a detecção de alterações cujo impacto clínico não está definido. Este texto, dirigido principalmente a profissionais de saúde, apresenta um guia objetivo para interpretação, reclassificação e comunicação de VUS, mantendo linguagem acessível para pacientes acompanhados por equipe médica.

O que são VUS e por que aparecem

VUS são alterações no DNA cuja associação com doença não pode ser confirmada ou descartada com as evidências disponíveis no momento. As classificações seguem diretrizes como as da ACMG/AMP, que categorizam variantes entre patogênicas e benignas, com VUS no centro da incerteza. A designação pode mudar ao longo do tempo à medida que surgem dados populacionais, funcionais ou clínicos.

Estruturação prática da interpretação de VUS

Adote uma abordagem sistemática que integre múltiplas fontes de evidência. A seguir, etapas práticas que facilitam a tomada de decisão clínica.

Validação analítica

Confirme a qualidade da chamada de variante: cobertura de leitura, qualidade das bases e presença de alelos de referência. Solicite re-sequenciamento ou confirmação por método alternativo quando houver dúvida técnica.

Frequência populacional (ex.: gnomAD)

Consulte bancos de dados de frequência populacional como gnomAD. Frequência elevada em populações saudáveis tende a favorecer classificação benigno, salvo exceções (por exemplo, genes com herança recessiva ou efeito de penetrância reduzida).

Predições in silico e dados funcionais

Use predições in silico com cautela: são auxiliares, não substituem evidência experimental. Priorize estudos funcionais que demonstrem impacto bioquímico ou celular, quando disponíveis.

Segregação familiar e fenótipo

A co-segregação da variante com a doença em familiares add evidência de patogenicidade. Avalie o fenótipo do paciente em detalhe — a interpretação deve integrar história, exame e achados complementares (veja, por exemplo, orientações sobre anamnese e exame físico).

Fluxo de decisão na prática: como proceder com uma VUS

  1. Registrar contexto clínico: documente história familiar, idade de início, sinais clínicos e exames prévios.
  2. Confirmar classificação: verifique o relatório laboratorial e bases públicas atualizadas para o status da variante.
  3. Buscar evidências adicionais: revisão de literatura, bancos de dados de variantes e, se necessário, solicitar reanálise ao laboratório.
  4. Planejar manejo baseado no risco: decisões de vigilância ou intervenções devem se basear no fenótipo e no risco associado ao gene, não apenas na VUS.
  5. Comunicar ao paciente: explique claramente o significado da VUS, opções de seguimento e a possibilidade de reclassificação.
  6. Reavaliação periódica: agende revisão (por exemplo, 12–24 meses) ou reavaliação sempre que surgirem dados novos.

Para estruturação do raciocínio clínico em interpretação de exames complementares, consulte materiais práticos sobre interpretação de exames.

Impacto clínico de VUS na prática diária

VUS podem gerar ansiedade em pacientes e incerteza em profissionais. Suas implicações incluem:

  • Solicitação de testes adicionais: re-sequenciamento, painéis complementares ou testes funcionais.
  • Aconselhamento genético: recomendação frequente de consulta com geneticista ou conselheiro para contextualizar risco e opções.
  • Rastreamento familiar: testes em parentes podem ser indicados quando houver suspeita de co-segregação.
  • Gestão baseada em risco: estratégias de vigilância devem considerar gene, fenótipo e histórico familiar, e não depender exclusivamente da VUS.

Em alguns contextos clínicos (por exemplo, doenças respiratórias com componente genético), recomenda-se integrar achados genéticos com avaliação clínica multidisciplinar, conforme modelos de diagnóstico e manejo de doenças respiratórias, quando aplicável.

Reclassificação de VUS: quando e como acontece

A reclassificação resulta da incorporação de novas evidências: dados populacionais, estudos funcionais, relatos de famílias adicionais ou alterações nos critérios laboratoriais. Estabeleça um plano de vigilância para reavaliação periódica e comunique ao paciente a possibilidade e o prazo estimado para novas avaliações.

Implicações éticas, consentimento e comunicação

Questões éticas incluem o direito à informação versus o risco de causar ansiedade com dados incertos. Recomendações práticas:

  • Incluir no consentimento pré-teste a possibilidade de resultados incertos e de reclassificação.
  • Usar linguagem clara e evitar jargões ao comunicar resultados ao paciente.
  • Preservar confidencialidade e discutir compartilhamento com familiares quando pertinente.
  • Planejar retorno de resultados com acompanhamento, incluindo encaminhamento para aconselhamento genético se necessário.

Casos ilustrativos e aplicações práticas

Dois cenários típicos demonstram abordagens pragmáticas:

  • Cenário A: indivíduo sintomático com histórico familiar sugestivo e uma VUS no gene suspeito. A conduta inclui avaliação clínica detalhada, investigação familiar para segregação, possibilidade de testes funcionais e planejamento de vigilância guiada pelo fenótipo.
  • Cenário B: achado incidental de VUS em indivíduo assintomático. Abordagem centrada em avaliação do risco gene-específico, discussão sobre rastreamento e decisão compartilhada entre clínico e paciente quanto ao seguimento.

Ferramentas e recursos úteis

Recorra a diretrizes e bases de dados confiáveis (por exemplo, diretrizes ACMG/AMP e bancos populacionais) e mantenha comunicação próxima com laboratórios que descrevem metodologia e limitações do teste. A colaboração multidisciplinar e o aconselhamento genético são essenciais em casos complexos.

Recomendações práticas para uso clínico

  • Baseie decisões em evidências combinadas e no fenótipo, não apenas na presença de VUS.
  • Documente claramente o contexto clínico e o plano de acompanhamento no prontuário.
  • Explique ao paciente que VUS indica incerteza e que a reclassificação é possível; ofereça agendamento para revisão periódica.
  • Considere encaminhamento para aconselhamento genético quando houver impacto potencial no manejo ou na família.

Este guia visa fornecer um roteiro prático e atualizado para profissionais que interpretam testes genéticos. Não substitui avaliação clínica individualizada nem o aconselhamento genético formal quando indicado.

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