SGLT2 além do diabetes: indicação em insuficiência cardíaca

Os inibidores de SGLT2 transformaram o manejo não só do diabetes mellitus tipo 2, mas também da insuficiência cardíaca e da doença renal crônica. A evidência robusta mostra redução de hospitalizações por insuficiência cardíaca, proteção renal e benefícios metabólicos independentes do controle glicêmico. Este texto oferece orientações práticas para indicação, prescrição e monitorização em pacientes com IC e/ou DRC, em linguagem clínica acessível.

O que são inibidores de SGLT2 e por que são importantes

Os inibidores de SGLT2 bloqueiam o cotransportador sódio-glicose no túbulo proximal renal, aumentando a excreção de glicose e promovendo efeitos hemodinâmicos e metabólicos. Além do efeito hipoglicemiante, essa classe reduz remodelamento cardíaco, diminui hospitalizações por insuficiência cardíaca e protege a função renal. Palavras-chave relacionadas que aparecem ao longo do texto: dapagliflozina, empagliflozina, eGFR, albuminúria e diuréticos.

Evidência clínica atual

SGLT2 em HFrEF (insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida)

Ensaios como DAPA-HF e EMPEROR-Reduced mostraram que dapagliflozina e empagliflozina reduzem hospitalizações por insuficiência cardíaca e piora clínica em HFrEF, com benefício observado independentemente do diagnóstico de diabetes. Por isso, SGLT2 inibidores são recomendados como componente da terapia padrão em HFrEF, em adição a betabloqueadores, IECA/ARA2, antagonistas de mineralocorticoide e diuréticos quando indicados.

SGLT2 em HFpEF (insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada)

Estudos recentes, como EMPEROR-Preserved, demonstraram redução de desfechos combinados (hospitalização por IC e piora clínica) em HFpEF, ampliando as opções terapêuticas para esse grupo historicamente carente de tratamentos com impacto robusto.

SGLT2 na doença renal crônica (DRC)

Ensaios como DAPA-CKD evidenciam retardamento da progressão da DRC e redução de eventos renais graves, inclusive em pacientes sem diabetes. O efeito renal é observado em populações com albuminúria e em diferentes estágios de DRC, com impacto favorável sobre o declínio da taxa de filtração glomerular (eGFR) ao longo do tempo.

Indicações práticas para insuficiência cardíaca e doença renal crônica

  • HFrEF: indicar SGLT2 inibidor (p. ex. dapagliflozina 10 mg/dia ou empagliflozina 10 mg/dia) como parte da terapêutica padrão, independentemente de diabetes.
  • HFpEF: considerar SGLT2 inibidores em pacientes sintomáticos ou com alto risco de hospitalização por IC, seguindo protocolos locais.
  • DRC: indicar em pacientes com evidência de dano renal ou albuminúria para reduzir risco de progressão, observando limites de eGFR vigentes nas recomendações do fabricante e diretrizes.
  • Pacientes com comorbidades: pacientes com IC associada à DRC, hipertensão, obesidade ou diabetes frequentemente se beneficiam da adição de SGLT2 por efeitos sobre peso, pressão arterial e proteinúria.

Antes de iniciar, avalie eGFR, sinais de desidratação, uso de diuréticos e estado hemodinâmico. Em eGFR reduzido é possível iniciar o tratamento em muitos casos, com monitorização mais estreita.

Como prescrever: orientações práticas

Escolha da molécula

As opções mais utilizadas no Brasil incluem dapagliflozina e empagliflozina. A escolha pode considerar disponibilidade, custo, experiência clínica e perfil de segurança, sobretudo risco de infecção genital e história de desidratação.

Dosagem inicial e ajuste

A dose comum de início é 10 mg/dia (dapagliflozina ou empagliflozina). Ajustes só são necessários se houver hipotensão sintomática, fraqueza ou queda acentuada da função renal. Em pacientes com albuminúria persistente, manter a dose é a estratégia habitualmente adotada, com monitorização de creatinina, eGFR e eletrólitos.

Uso concomitante com diuréticos e inibidores do RAAS

SGLT2 inibidores ampliam a diurese osmótica; portanto, ao associar com diuréticos de alça pode ser necessário reduzir a dose destes últimos para evitar hipovolemia. Monitorize peso, pressão arterial e sinais de hipotensão nas primeiras semanas. A associação com IECA/ARA2/MRA é comum e geralmente segura, mas exige acompanhamento da função renal e do potássio.

Monitorização laboratorial

  • Creatinina e eGFR antes do início e nas primeiras 2–4 semanas;
  • Eletrólitos (potássio, bicarbonato) periodicamente;
  • Glicemia e HbA1c se o paciente tiver diabetes ou estiver em terapia hipoglicemiante;
  • Avaliação de sinais de infecção urinária ou genital e orientações para higiene quando indicado.

Critérios de descontinuação

Considerar interromper em hipotensão sintomática refratária, insuficiência renal aguda progressiva, desidratação severa ou cetoacidose diabética (incluindo a cetoacidose euglicêmica). Em DRC avançada (eGFR muito baixo), a decisão deve ser individualizada entre clínico e nefrologista.

Segurança e efeitos adversos

  • Infecções genitais e urinárias — geralmente leves a moderadas e tratáveis;
  • Queda inicial da eGFR que tende a estabilizar; monitorizar nas primeiras semanas;
  • Desidratação e hipotensão, especialmente em associação com diuréticos;
  • Cetoacidose diabética euglicêmica — rara, mas potencialmente grave; suspeitar se houver náuseas, vômitos, dor abdominal, taquipneia ou mal-estar mesmo com glicemia não muito elevada.

Integração com outras terapias

SGLT2 inibidores complementam, não substituem, terapias essenciais para IC e DRC. Mantenha betabloqueador, IECA/ARA2, MRA e diurético conforme indicação. Em DRC, ajuste terapêutico para proteinúria e hipertensão conforme diretrizes locais; em alguns casos, considerar finerenona quando indicado.

Recursos adicionais e leituras relacionadas

Para ampliar o contexto prático e educacional, consulte conteúdos do nosso portal sobre diabetes, função renal e hipertensão que complementam o manejo com SGLT2 inibidores. Exemplos úteis para revisão clínica incluem diabetes tipo 2 atualizado, doença renal crônica atencao primaria avaliacao/encaminhamento, manejo hipertensao primaria e encaminhamento manejo da doença renal inicial. Esses textos são complementares para entender controle glicêmico, avaliação renal e fluxos de encaminhamento na rede assistencial.

SGLT2 na insuficiência cardíaca e DRC: recomendações finais

  • Identifique pacientes elegíveis com HFrEF, HFpEF ou DRC (com ou sem diabetes) e avalie eGFR e volume antes de iniciar.
  • Inicie dapagliflozina ou empagliflozina na dose usual (10 mg/dia) quando indicado, com monitorização laboratorial e ajuste de diuréticos conforme necessário.
  • Eduque o paciente sobre sinais de infecção genital, desidratação e sinais sugestivos de cetoacidose; mantenha comunicação com equipe multidisciplinar (cardiologia, nefrologia, endocrinologia).
  • Documente desfechos clínicos (hospitalizações por insuficiência cardíaca, declínio de eGFR, eventos renais) para avaliar impacto local e orientar políticas de saúde e acesso a fármacos.

O uso de inibidores de SGLT2 representa, na prática clínica, uma estratégia de alto impacto para reduzir hospitalizações por insuficiência cardíaca, proteger a função renal e melhorar desfechos em pacientes com múltiplas comorbidades. A adoção segura depende de avaliação prévia, monitorização ativa e integração com terapias já estabelecidas.

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