Vigilância e manejo inicial de infecções respiratórias
Introdução
Como a sua unidade de Atenção Primária à Saúde (APS) está preparada para o próximo período de maior circulação de vírus respiratórios? Com picos no outono e inverno, vírus como influenza e Vírus Sincicial Respiratório (VSR) aumentam a demanda por serviços e elevam o risco de SRAG em grupos vulneráveis. Este texto traz orientações práticas para vigilância epidemiológica, diagnóstico, manejo inicial e prevenção de complicações na APS.
1. Vigilância na APS: detectar cedo para responder melhor
A vigilância epidemiológica em nível primário é a porta de entrada para identificação precoce de surtos e ativação de medidas de controle. Boas práticas incluem notificação oportuna, monitoramento de síndrome gripal/SRAG e comunicação com as redes municipais/estaduais de saúde.
- Registre e notifique casos suspeitos conforme protocolos locais; mantenha comunicação direta com a vigilância municipal.
- Use dados de frequência de consultas por síndrome gripal e de testes rápidos para sinalizar aumento de transmissão.
- Participe de iniciativas nacionais, como as diretrizes para enfrentamento de vírus respiratórios e salas de situação do Ministério da Saúde para monitoramento (veja orientações institucionais do Ministério da Saúde e a sala de situação sobre infecções por vírus respiratórios de 2025).
Organização prática na unidade
- Estabeleça fluxo de triagem separado para síndromes respiratórias.
- Capacite agentes comunitários para busca ativa de grupos de risco e vacinação (consulte materiais como o Guia de Busca Ativa de Vacinação).
- Padronize fichas e registros para facilitar análises temporais locais.
2. Diagnóstico diferencial: quando pensar em influenza, VSR ou outra virose
Na APS, o diagnóstico é frequentemente clínico. Conhecer padrões clínicos e epidemiológicos ajuda a diferenciar etiologias e a decidir encaminhamentos e testes complementares.
Sinais e padrões úteis
- Influenza: início súbito de febre alta, mialgia intensa, cefaleia, tosse seca. Maior impacto em idosos, gestantes e portadores de comorbidades.
- VSR: costuma afetar crianças pequenas com bronquiolite (sibilância, taquipneia) e idosos com exacerbações de doença respiratória crônica. Em adultos jovens, sintomas semelhantes a resfriado/bronquite.
- Outras viroses (rinovírus, metapneumovírus, coronavírus sazonais): quadro respiratório variável, geralmente menos proeminente febre e mais congestão nasal/faringite.
Exames e uso racional de testes
- Testes rápidos de antígeno e RT-PCR orientam vigilância e manejo em grupos de risco; priorize em pacientes com indicação de antiviral ou internamento previsto.
- Utilize critérios de gravidade (p. ex., sinais de SRAG: dispneia, taquipneia, saturação <92%, confusão) para definir encaminhamento hospitalar.
- Evite uso indiscriminado de antibióticos; baseie a conduta em sinais de sobreinfecção bacteriana — consulte práticas locais de prescrição racional: prescrição racional de antibióticos na APS.
3. Manejo clínico inicial na APS
O tratamento inicial visa suporte, reduzir complicações e indicar antivirais quando apropriado. A maior parte dos casos leves é manejada ambulatorialmente.
Medidas gerais
- Hidratação e repouso.
- Controle sintomático da febre e dor com antipiréticos/analgésicos (paracetamol ou AINEs conforme contraindicações).
- Orientação sobre sinais de alarme que exigem retorno rápido ou encaminhamento.
Antivirais e indicações
- Para influenza: considerar oseltamivir em pacientes de alto risco (idosos, gestantes, imunossuprimidos, portadores de comorbidades) e em casos graves; idealmente iniciar nas primeiras 48 horas, mas considerar mesmo após esse período em pacientes hospitalizados ou graves.
- Para VSR: não há antivirais de rotina para a maioria; o manejo é de suporte. Em recém-nascidos e algumas situações especiais, medidas específicas (p. ex., ribavirina) são avaliadas por equipes hospitalares especializadas.
- Evitar antivirais ou antibióticos fora das indicações; orientações e fluxos locais devem ser seguidos.
Encaminhamento e critérios para hospitalização
- Saturação <92% em ar ambiente, taquipneia grave, uso de musculatura acessória, apneia (pediatria), hipotensão, confusão mental.
- Progressão rápida dos sintomas, desidratação importante ou necessidade de oxigênio/ventilação.
- Crianças menores de 3 meses com febre ou quaisquer sinais de comprometimento geral.
4. Prevenção e redução de complicações
A prevenção combina imunização e medidas não farmacológicas — ações centrais da APS para reduzir internações e mortes.
Vacinação
- A vacinação contra influenza é a medida preventiva mais eficaz para reduzir gravidade e hospitalizações; priorize cobertura em idosos, gestantes, crianças e portadores de comorbidades. Planeje campanha local e busca ativa de faltosos (veja materiais práticos para estratégia de busca ativa e adesão).
- Em lactentes de alto risco, considerar esquemas profiláticos de palivizumabe conforme protocolos pediátricos locais.
- Integre registros de vacinação em campanhas e agende monitoramento de cobertura.
Medidas não farmacológicas
- Higiene das mãos, etiqueta respiratória, uso de máscara em ambiente de alto risco e melhoria da ventilação em espaços fechados.
- Educação à população sobre isolamento de casos, duração da transmissibilidade e cuidados domiciliares.
5. Papel da APS: educação, capacitação e continuidade
A APS coordena prevenção, diagnóstico precoce, tratamento inicial e seguimento. Isso requer equipes treinadas, fluxos claros e materiais educativos para população.
- Capacitação contínua dos profissionais sobre critérios de triagem, manejo de SRAG e uso racional de exames e medicamentos. Consulte conteúdos práticos, como o guia de anamnese respiratória e manuais de manejo: anamnese do aparelho respiratório e manejo pragmático de infecções respiratórias agudas na APS.
- Implemente protocolos de triagem e fluxos de encaminhamento, incluindo rotina para identificar SRAG e notificar eventos em surtos.
- Promova uso racional de antibióticos e antivirais; materiais sobre prescrição segura são ferramentas úteis na clínica diária (prescrição racional).
Fechamento: orientações práticas para o cotidiano
Na prática, combine vigilância ativa, educação e condutas clínicas padronizadas. Priorize vacinação, identifique sinais de gravidade cedo e proteja grupos vulneráveis. A adoção de fluxos simples de triagem, capacitação da equipe e integração com a vigilância pública (incluindo a utilização de salas de situação e diretrizes nacionais) melhora a resposta local e reduz complicações.
Para protocolos e ferramentas aplicáveis na sua unidade, consulte os guias e referências institucionais citadas ao longo do texto e adapte fluxos conforme recursos locais. Atingir maior resiliência frente às epidemias sazonais depende da atuação consistente da APS na prevenção, diagnóstico e manejo inicial.