Crises convulsivas em adultos: avaliação e encaminhamento

Crises convulsivas em adultos: avaliação e encaminhamento

Crises convulsivas em adultos exigem avaliação rápida e estruturada no serviço de urgência. Embora muitas convulsões sejam autolimitadas, algumas configuram emergência neurológica — por exemplo, status epilepticus — e demandam intervenções imediatas para reduzir risco de dano neurológico. Este texto, dirigido a profissionais de saúde, traz abordagem prática para avaliação aguda, exames essenciais, manejo inicial e critérios de encaminhamento, em linguagem técnica porém acessível.

Definição e diferenciação de crises convulsivas

É fundamental classificar o evento para orientar condutas. As convulsões em adultos incluem:

  • Crises generalizadas tônico-clônicas: envolvem ambos os hemisférios desde o início, com perda de consciência e movimentos tonico-clônicos.
  • Crises focais: sinais motores ou não-motores localizados que podem progredir para generalização.
  • Status epilepticus: atividade convulsiva contínua >5 minutos ou crises recorrentes sem recuperação plena entre episódios.
  • Crises não epilépticas de origem psicogênica: simulam convulsões, exigindo diferenciação clínica e eletrofisiológica.
  • Convulsões relacionadas a fatores precipitantes: intoxicação, hipoglicemia, alterações eletrolíticas ou infecção do sistema nervoso central.

Avaliação aguda na prática clínica

O objetivo inicial é estabilizar, identificar causas reversíveis e decidir sobre internação e encaminhamento neurológico. Siga um fluxo ABCD adaptado ao cenário de emergência.

Abordagem inicial (vias aéreas, respiração e circulação)

  • Via aérea e proteção: assegure via aérea pérvia, proteja contra aspiração e imobilize o pescoço se houver trauma associado.
  • Respiração e oxigenação: administre oxigênio se SpO2 <90% ou conforme necessidade; monitore frequência respiratória e saturação.
  • Circulação: monitorize pressão arterial e frequência cardíaca; trate instabilidade hemodinâmica.
  • Registro temporal: documente início e duração da crise — crises >5 minutos ou recorrência sem recuperação sugerem risco de status epilepticus.

Exames laboratoriais e avaliação clínica imediata

  • Glicemia capilar: identificar e corrigir hipoglicemia imediatamente.
  • Eletrólitos, função renal e hepática: distúrbios metabólicos (sódio, cálcio, magnésio) podem precipitar crises.
  • Hemograma e marcadores de infecção quando houver suspeita de sepse ou infecção do SNC.
  • Avaliação toxicológica conforme história (álcool, benzodiazepínicos, antidepressivos, anfetaminas).
  • Teste de gravidez em mulheres em idade fértil, devido a implicações no uso de antiepilépticos.

Imagem e eletroencefalograma (EEG)

  • Tomografia computadorizada (TC/CT) de crânio sem contraste é indicada na maioria dos casos agudos para excluir hemorragia, lesão ocupante de espaço ou trauma.
  • Ressonância magnética (RM) é recomendada assim que o paciente estiver estável para investigar causas estruturais quando a TC for inconclusiva.
  • EEG é essencial para confirmar encefalopatia epiléptica, identificar padrões ictais intermitentes e diferenciar crises não epilépticas; deve ser realizado o quanto antes quando houver dúvida diagnóstica.

Interprete TC, RM e EEG em conjunto com história clínica e exame neurológico. Se houver suspeita de meningite ou encefalite, priorize avaliação e tratamento específicos e encaminhamento imediato.

Manejo inicial e escalonamento terapêutico

O objetivo é interromper a crise com segurança e preparar investigação etiológica e seguimento.

Benzodiazepínicos como primeira linha

  • Administre benzodiazepínico rapidamente para convulsão em andamento: lorazepam IV (0,1 mg/kg, até 4 mg) é opção preferencial; se não houver via IV, midazolam intramuscular ou intranasal é eficaz.
  • Monitore depressão respiratória e necessidade de suporte ventilatório, especialmente em idosos ou em uso concomitante de sedativos.

Segunda linha: antiepilépticos de carregamento

  • Se convulsão persistir após benzodiazepínico, administre antiepiléptico de segunda linha: levetiracetam IV (uso comum: 1–3 g em bolus) ou valproato IV (20–40 mg/kg, com cautela em doença hepática e em mulheres em idade fértil).
  • Alternativas incluem fenitoína/fosfenitoína (20 mg PE/kg) com monitorização cardiovascular durante infusão.
  • Crises refratárias ao escalonamento devem ser manejadas em UTI com anestésicos contínuos (por exemplo, propofol ou midazolam em infusão) e monitorização eletrográfica contínua.

Critérios para encaminhamento a neurologia/epileptologia

  • Status epilepticus refratário ao tratamento inicial.
  • Primeira crise sem causa clara ou com sinais de lesão estrutural/infecciosa.
  • Crises focais com déficit neurológico persistente ou curso atípico.
  • Planejamento de tratamento de longo prazo para epilepsia recém-diagnosticada ou ajuste de antiepilépticos.

Ao encaminhar, descreva claramente o quadro agudo, exames realizados, hipótese diagnóstica e medidas terapêuticas adotadas.

Planejamento de seguimento e investigação etiológica

Principais causas e fatores de risco a investigar

  • Trauma craniano, infecções do sistema nervoso central (meningite, encefalite), tumores e malformações vasculares.
  • Desequilíbrios metabólicos (hipoglicemia, hiponatremia, hipocalcemia) e intoxicações.
  • História de epilepsia prévia, uso de medicamentos pró-convulsivantes ou suspensão abrupta de antiepilépticos.
  • Comorbidades hepáticas ou renais que influenciam escolha e dose de antiepilépticos.

Seguimento clínico e terapêutico

  • Defina em conjunto com o paciente e família o regime de antiepilépticos apropriado, considerando comorbidades, interação medicamentosa e possibilidade de gravidez.
  • Planeje EEG de controle e RM quando indicado, além do monitoramento de efeitos adversos e níveis plasmáticos quando aplicável.
  • Oriente sobre adesão, sinais de alerta e medidas para redução de risco (evitar álcool em excesso, aderir à medicação, identificação médica para pacientes com risco de recorrência).

Comunicação com pacientes e utilização de material complementar

Explique ao paciente e cuidadores o que ocorreu, os exames realizados e o plano de seguimento. Utilize material educativo simples para facilitar entendimento. Para avaliação diferencial com distúrbios do sono, que podem confundir o diagnóstico de crise, consulte o post Distúrbios do sono na prática clínica. Em serviços de atenção primária ou unidades com foco em dor e sintomas neurológicos, pode ser útil comparar estratégias descritas em Dor lombar aguda: avaliação e manejo e em Dor torácica não aguda: avaliação e encaminhamento, especialmente quando o diagnóstico diferencial envolve manifestações neurológicas ou sistêmicas.

Pontos práticos sobre encaminhamento e seguimento

Implemente protocolos locais claros para o manejo agudo: disponha de benzodiazepínicos de primeira linha, esquemas para antiepilépticos de carregamento (leve­tiracetam, valproato, fenitoína) e critérios objetivos para transferência para UTI e consulta neurológica. Realize TC em fase aguda quando houver suspeita de lesão estruturai, e programe RM e EEG para investigação etiológica. A comunicação efetiva com paciente e familiares é essencial para adesão e redução de recorrências.

Para dúvidas sobre casos complexos, adapte as recomendações às diretrizes locais e protocolos institucionais, sempre priorizando a interrupção segura da crise, a identificação da etiologia e o cuidado coordenado entre emergência, neurologia e follow-up ambulatorial.

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