Doença de Wilson: diagnóstico e manejo atualizados
A Doença de Wilson é uma enfermidade genética rara, causada por mutações no gene ATP7B, que provoca acúmulo tóxico de cobre no fígado, cérebro e córnea. O reconhecimento precoce e o tratamento adequado — com quelantes, sais de zinco e, quando indicado, transplante hepático — são determinantes para prevenir falência hepática e sequela neurológica irreversível.
Doença de Wilson: sinais clínicos e quando suspeitar
O espectro clínico varia: pacientes jovens costumam apresentar sinais hepáticos como hepatomegalia, icterícia e progressão para cirrose; já os adultos podem debutar com tremor, distonia, disartria, alterações de marcha ou mudanças comportamentais e psiquiátricas. A presença de anéis de Kayser-Fleischer ao exame oftalmológico é um achado sugestivo, mas sua ausência não exclui o diagnóstico, sobretudo em apresentações predominantemente hepáticas.
ATP7B, ceruloplasmina e exames laboratoriais
O diagnóstico exige correlação clínica e exames laboratoriais: ceruloplasmina plasmática tipicamente baixa, cobre sérico total pode estar baixo e há aumento da excreção urinária de cobre (24 horas). Em casos duvidosos, a medição da carga de cobre hepático por biópsia é indicada. A avaliação por imagem (ressonância magnética do encéfalo) ajuda na caracterização das alterações neurológicas.
Para abordagem das doenças hepáticas em atenção primária e critérios para investigação inicial, consulte nosso material sobre manejo de hepatites B e C na Atenção Primária, que traz orientações práticas sobre exames e encaminhamentos relevantes também para pacientes com suspeita de acúmulo hepático.
Diagnóstico diferencial e papel da biópsia hepática
É fundamental diferenciar Doença de Wilson de outras causas de doença hepática crônica e de síndromes neurológicas degenerativas. A biópsia hepática, com quantificação do cobre hepático, permanece como padrão em situações em que dados bioquímicos e genéticos são inconclusivos. Para avaliação de fibrose e estratégias de imagem não invasiva, ver nosso guia sobre NAFLD/NASH e o uso do FibroScan, aplicável na rotina de avaliação hepática.
Tratamento da Doença de Wilson: quelantes, zinco e transplante
O objetivo terapêutico é remover o excesso de cobre e impedir sua reabsorção. As opções incluem:
- Quelantes de cobre: D-penicilamina e trientina aumentam a excreção urinária de cobre. A escolha depende da tolerabilidade e do perfil de efeitos adversos; monitoramento laboratorial regular é obrigatório para ajustar doses e detectar toxicidade.
- Sais de zinco: inibem absorção intestinal de cobre e são indicados como terapia de manutenção após desintoxicação inicial ou como alternativa em pacientes com efeitos colaterais aos quelantes.
- Transplante hepático: reservado para insuficiência hepática aguda, cirrose descompensada ou falha terapêutica; pode reverter manifestações hepáticas e, em graus variáveis, neurológicas.
D-penicilamina, trientina e manejo das reações adversas
A D-penicilamina pode causar reações imunológicas e proteinúria; a trientina tem perfil mais favorável em alguns casos, mas exige monitorização. Interrupções abruptas do tratamento aumentam risco de recrudescência. Educação sobre adesão, interação medicamentosa e restrição dietética (evitar alimentos ricos em cobre como fígado, mariscos e castanhas em excesso) é parte integral do plano terapêutico.
Monitoramento longitudinal e prognóstico
O seguimento inclui exames de função hepática, mensuração periódica de cobre urinário de 24 horas, avaliação neurológica e acompanhamento oftalmológico. A adesão ao tratamento determina o prognóstico; com terapia adequada, muitos pacientes têm sobrevida normalizada. Em serviços de atenção primária e hepatologia, a coordenação do cuidado e o encaminhamento oportuno são essenciais — veja orientações sobre manejo de complicações hepáticas e encefalopatia em nosso texto sobre encefalopatia hepática mínima, que complementa o raciocínio clínico em pacientes com disfunção hepática crônica.
Recomendações práticas para clínicos e pacientes
Suspeite de Doença de Wilson em hepatopatias de causa indeterminada em jovens, movimentos extrapiramidais precoces ou alterações psiquiátricas atípicas. Solicite ceruloplasmina, cobre sérico e cobre urinário de 24 horas; em dúvida, investigue mutações no ATP7B ou considere biópsia hepática. Oriente sobre dieta com redução de cobre, importância da adesão aos quelantes ou ao zinco e necessidade de acompanhamento multidisciplinar (hepatologia, neurologia, oftalmologia e assistência farmacêutica).
Para aprofundar o embasamento científico e revisões multidisciplinares, consulte a revisão publicada na Revista Médica de Minas Gerais, a análise prática disponível no PubMed (Practical and Multidisciplinary Review on Wilson Disease) e a atualização bioquímica acessível no PubMed Central (Actualización en el diagnóstico bioquímico de la enfermedad de Wilson).
Manejo a longo prazo e orientações para pacientes
O acompanhamento vitalício é a regra. Pacientes devem receber educação sobre sinais de descompensação, plano de emergência para eventos hepáticos e suporte para adesão farmacológica. Equipes de saúde devem estabelecer protocolos locais para rastreamento familiar, testes genéticos e transição do cuidado pediátrico para o adulto. Para casos complexos, o encaminhamento a centros especializados e a discussão multidisciplinar garantem melhores desfechos.
Se precisar de material de apoio para pacientes ou fluxos de encaminhamento, temos recursos complementares no blog que abordam avaliação hepática, estratégias de monitoramento e cuidados contínuos para doenças hepáticas crônicas.
Fontes externas selecionadas foram usadas para embasar recomendações e podem ser consultadas para revisão aprofundada: Revista Médica de Minas Gerais (artigo de revisão), PubMed (revisão prática) e PubMed Central (atualização diagnóstica).